pedras de toque da poesia brasileira

SER RETO, ESTAR DIRETO E FAZER CONCRETO


por José Guilherme Corrêa


No seu livro de memórias, A cabra vadia, Nelson Rodrigues fala de “um fato sólido [que] foi a luminosidade escandalosa de José Lino Grünewald”.


Outro amigo dileto de José Lino, Mário Faustino, escreveu: “José Lino Grünewald: o intelectual: autodeterminação, profissio-nalismo, estudo e trabalho sério, in my craft or sullen art, vanguarda, invenção, nenhuma turris eburnea, interesse universal [...] de nível mais alto e de contribuição mais importante do que muito poeta mais velho, famoso, comentado, laureado, super-publicado, coligido, selecionado, citado. Criação de vocábulos novos, criação de novas relações sintáticas, de novas matrizes metafóricas. Tentativas, com bons sucessos e bons fracassos, de renovação da frase musical, dentro ou fora da tradição do idioma. Capacidade evocativa. O aparente preciosismo de JLG: sempre uma necessidade experimental, trigo em todos os lotos”.

 

Pode haver melhor introdução para o tradutor dos Cantos de Ezra Pound? Dificilmente.


O crítico soube captar as essências e discernir as medulas de um autor cujas ideias podem ser classificadas assim, sintética e sincronicamente: José Lino foi, a um tempo, antivintage, antifashion e antikitsch. Vintage, no mundo literário, é o fardão; fashion, as listas de best-sellers; kitsch, os beletristas, que (existem ainda e) batem ponto nas improváveis tertúlias. José Lino, por exclusão, não foi nada disso. Tampouco pertenceu às correntes que apelidamos de chapa-branca, embora, esporadicamente, trabalhasse como ghostwriter para esta ou aquela estrela, no Quem É Quem de nossa res publica. Ao mesmo tempo, nesse pindorâmico purgatório da vida criativa, ele criou um corpo de obra. Relativamente modesto, longe de manancioso, mas não exatamente minimalista. De sua própria lavra saiu o termo-chave, autoqualificativo: escreviver = ver + viver + escrever, a sua suma medular, essencial.


À pergunta “O poeta é um sofredor ou um fingidor?”, feita por um entrevistador, José Lino respondeu: “O poeta pode ser tudo; mas o ideal é o Nada. Tento ser um ente dialético”.


O bom entendedor, aquele a quem meia frase costuma bastar, discerne aí ecos do Igitur, de Stéphane Mallarmé, que o próprio José Lino traduziu: “O Nada tendo partido, resta o castelo 

da pureza”.

  


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