Cai em música estranha a rima sobre a rima,
num sonoro rumor de mármores partidos
Alves de Faria
Cansada cornucópia entre festões de rosas murchas
Décio Pignatari
América do Sul
América do Sol
América do Sal
Oswald de Andrade
O azar é um dançarino nu entre os alfanges
Haroldo de Campos
Brasil é braseiro de rosas;
A União, estados de amor:
Floral ... sub-espinhos
Daninhos
Espinhal sub flor e mais flor.
Sousândrade
À tarde o poente despia
Topázios em filigrana
Vindo ouvir a melodia
Dos vasos de porcelana
Ernani Rosas
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pedras de toque da poesia brasileira
SER RETO, ESTAR DIRETO E FAZER CONCRETO
por José Guilherme Corrêa
No seu livro de memórias, A cabra vadia, Nelson Rodrigues fala de “um fato sólido [que] foi a luminosidade escandalosa de José Lino Grünewald”.
Outro amigo dileto de José Lino, Mário Faustino, escreveu: “José Lino Grünewald: o intelectual: autodeterminação, profissio-nalismo, estudo e trabalho sério, in my craft or sullen art, vanguarda, invenção, nenhuma turris eburnea, interesse universal [...] de nível mais alto e de contribuição mais importante do que muito poeta mais velho, famoso, comentado, laureado, super-publicado, coligido, selecionado, citado. Criação de vocábulos novos, criação de novas relações sintáticas, de novas matrizes metafóricas. Tentativas, com bons sucessos e bons fracassos, de renovação da frase musical, dentro ou fora da tradição do idioma. Capacidade evocativa. O aparente preciosismo de JLG: sempre uma necessidade experimental, trigo em todos os lotos”.
Pode haver melhor introdução para o tradutor dos Cantos de Ezra Pound? Dificilmente.
O crítico soube captar as essências e discernir as medulas de um autor cujas ideias podem ser classificadas assim, sintética e sincronicamente: José Lino foi, a um tempo, antivintage, antifashion e antikitsch. Vintage, no mundo literário, é o fardão; fashion, as listas de best-sellers; kitsch, os beletristas, que (existem ainda e) batem ponto nas improváveis tertúlias. José Lino, por exclusão, não foi nada disso. Tampouco pertenceu às correntes que apelidamos de chapa-branca, embora, esporadicamente, trabalhasse como ghostwriter para esta ou aquela estrela, no Quem É Quem de nossa res publica. Ao mesmo tempo, nesse pindorâmico purgatório da vida criativa, ele criou um corpo de obra. Relativamente modesto, longe de manancioso, mas não exatamente minimalista. De sua própria lavra saiu o termo-chave, autoqualificativo: escreviver = ver + viver + escrever, a sua suma medular, essencial.
À pergunta “O poeta é um sofredor ou um fingidor?”, feita por um entrevistador, José Lino respondeu: “O poeta pode ser tudo; mas o ideal é o Nada. Tento ser um ente dialético”.
O bom entendedor, aquele a quem meia frase costuma bastar, discerne aí ecos do Igitur, de Stéphane Mallarmé, que o próprio José Lino traduziu: “O Nada tendo partido, resta o castelo
da pureza”.