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A Noiva Estava de Prêto

Em matéria de François Truffaut não se pode falar rigorosamente de influência de Hitchcock, tal a consciência com que recria certas sensações e perspectivas próprias àquele que é o mestre do thriller (o gênero por excelência) e um dos maiores cineastas de todos os tempos. A começar pela convocação de Bernard Herrmann para realizar o acompanhamento musical e que é o músico preferido de Hitch e autor de uma partitura, como a de Vertigo, exponencial como criação e funcionalidade em relação ao fluxo de imagens. Herrmann, aliás, neste A Noiva Estava de Prêto, usa com muita acuidade os acordes da Marcha Nupcial, além de envolver várias passagens com a sua marcação original. O uso das côres de Raul Coutard (um dos melhores cameramen franceses) é também, em suas tonalidades, evocativo do espírito hitchcockiano. Também o estar de Jeanne Moreau lembra o de atrizes que trabalharam com o grande diretor. Enfim, as chamadas ''citações" propositais, como aquela da assassina relatando seus crimes e sua disposição na bôca do confessionário (vide I Confess), ou a inversão do mistério em tragédia (a partir do flash-back revelador do crime contra o noivo), quando, então, numa espécie de "paradinha" de Pelé, modifica-se inteiramente o espírito da fita. (vide Vertigo).
Aí está, pois, La Mariée Était en Noir, filme saudavelmente amoral sob o ponto de vista das convenções de se encarar e julgar determinadas situações, a narrar, com base num romance de William Irish, a obstinação de uma vingança. Traída pelo amor que começara a lhe despertar um dos cinco homens marcados por ela para morrer (em troca da vida do noivo, estupidamente sacrificada numa tarde de plaisanterie entre solteiros), a vingadora, apesar do véu prêto, é reconhecida no entêrro de sua quarta vítima; porém - e até isto era um pretexto para o encontro - na prisão, achará o momento certo de executar a sua última missão, contra aquêle que, aliás, havia de fato detonado o rifle no dia do seu casamento.
A carreira de François Truffaut - antes de se transformar em cineasta, um dos críticos mais atuantes do Cahiers du Cinéma, e demolidor do velho cinema francês - registra uma obra que constitui um dos maiores filmes da história do cinema, Jules et Jim (traduzido incrivelmente, no Brasil, para Uma Mulher para Dois), protagonizado magistralmente pela mesma Jeanne Moreau, uma das grandes atrizes de todos os tempos e que, em entrevista há alguns anos atrás, reconhecia mesmo ser aquêle; supramencionado, o melhor filme onde atuou. Antes e depois desta realização, Truffaut jamais conseguiu sequer atingir nível próximo (sempre, no máximo, bons filmes), sendo que os melhores ainda seriam o seu episódio de Amor aos Vinte Anos e La Peau Douce. Arrisca-se a ficar como cineasta de um filme só, embora Baisers Volés haja obtido muitos elogios.
La Marié Était en Noir figura neste plano de realizações válidas, porém sem maiores consequências. Repousa em grande parte na personalidade de Jeanne Moreau, novamente em admirável interpretação, transmitindo nos menores gestos a sua fria obstinação. Algumas cenas são muito bem construídas, como aquela dos preparativos, encontro e môrte do quarentão tímido (otimamente vivido por Michel Bouquet), quando tudo é sutileza e sensibilidade. O trecho é quase que um curta metragem autônomo dentro da fita, com a descrição do personagem, a presentificação do seu comportamento, o diálogo, o encontro no quarto modesto de solteiro com a mulher-mistério; que o envenena e rodopia implacável em tôrno do tímido que estertora em sua quase glória amorosa. Aliás, com a excecão de uma (exatamente o responsável principal, que ia escapando da vindita), tôdas as vítimas são intencionalmente humanizadas.
Mas carece o filme de uma intensidade maior dentro da tragédia policial e, de modo geral, a frieza intelectual atola o espetáculo. Na ânsia da homenagem, Truffaut não passou de um Hitchcock menor.

Correio da Manhã
25/09/1969

 
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