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Uma Noite na Ópera

Uma Noite na Ópera data de 1935. São 34 anos de riso, rasgando a erosão do tempo. Talvez nem seja a maior comédia dos Irmãos Marx, porém, continua sendo uma das melhores comédias do cinema americano, certamente valorizada pela direção de Sam Wood, que, na opinião de vários críticos, era um dos grandes cineastas de sua época (além de Uma Noite na Ópera, parte de E o Vento Levou, Ivy, Por Quem os Sinos Dobram, Saratoga Trunk ou Em Cada Coração um Pecado).
Os subversivos Irmãos Marx, sempre rompendo com a ordem das coisas e dos valores. Tempestade do objeto em situação alógica. É o non-sense de Groucho, descozendo o universo verbal, até com aquelas espécies de máximas de ocasião que fazem vislumbrar o absurdo através da demolição de um sistema conceitual. É o dadaismo espontâneo, delirante, do mudo Harpo, que reage e gesticula em analogia à fala de Groucho; por exemplo, ele está dormindo, o despertador toca, ele acorda e destrói o relógio com um imenso martelo tirado de entre os lençóis.
Logo de saída, o trio entra em cena substituindo o tradicional leão que rosna dentro da vinheta da Metro Goldwyn Mayer. E começa a paródia em transe, O navio - o camarote de Groucho, com dimensões mínimas, é quase do tamanho da sua mala, onde se escondem os três clandestinos: Harpo, Chico e Riccardo, êste último vivido pelo tenor Allan Jones, que cantou em vários sucessos da Metro e, no lugar de Nelson Eddy, protagonizou, junto com Jeannette Mac-Donald, o excelente
The Firefly (O Vagalume), onde interpretou o seu número de maior êxito, A Serenata da Mula. No camarote, vão entrando as manicuras, o empregado que vai desligar um aparelho, a moça que procura outra pessoa, a fileira de garçons envergando bandejas, as arrumadeiras. Um desafio às leis de compressão dentro do espaço. Quando a visita de Groucho abre a porta, a massa humana eclode e é projetada pela saída.
Como suporte às façanhas do trio subversivo, temos números musicais interpretados por Allan Jones e Kitty Carlisle, além de um supporting-cast operístico. O tenor e o soprano cantam o
Miserere, de II Trovatore e a bonita canção, Alone. Allan Jones canta, no convés do navio, a cançoneta Cosi Cosa. Mas a música - ou a ópera em si - implicam no pretexto para uma das sequencias mais longas, loucas e hilariantes da história da comédia, exatamente na parte final do filme. Vai subir à cena II Trovatore, de Verdi, uma espécie de western da ópera, pelo que contém de desafio aos agudos e dós de peito e de correria dramalhonesca nos entrecantos. Melhor ensejo não há parà uma travessura completa dos Marx. Querem tumultuar o espetáculo, a fim de ver se conseguem substituir os protagonistas da ópera, principalmente o tenor-vilão, por Riccardo e sua namorada. Groucho instala-se no camarote do diretor e começa a soltar gracinhas. Chico e Harpo introduzem-se na orquestra. O maestro aciona a batuta para a ouverture, Harpo espicha o arco do seu violino e inicia um duelo com o maestro. Groucho irrompe na platéia vendendo pipocas. O maestro, enfim, consegue principiar a ouverture. De repente a imponência verdiana é substituída pela musiquinha conhecida, Take Me Out to the Ball Game, cuja partitura foi inserida entre as folhas de cada músico. É o convite para Chico e Harpo jogarem alguns lances de base-ball, usando, êste último, o violino para rebater a bola. Afinal, ação no palco. Azucena entoou sua ária. Vem o famoso côro dos ferreiros e um par de dançarinos inicia suas evoluções. Harpo mete-se no meio dêles, faz cócegas na barriga da bailarina. A polícia persegue-os pelos bastidores. O tenor ataca, com a contralto, o notável dueto, Mal Reggendo, enquanto Harpo, no vaivém pelas cordas, vai mudando os cenários de papelão, ao fundo. Pânico no palco. Após o dó de peito do tenor, em Di Quella Pira, o mudo desce pelo papelão, rasgando-o de alto a baixo. Afinal, o tenor perde a peruca, tomba abatido, desaparece. O teatro chega ao holocausto da bagunça, com os espectadores atônitos. Nada mais a fazer, os Irmãos Marx venceram em tôda a linha, a sua guerrilha estabeleceu o caos. Venceu também o cinema, numa de suas passagens mais esfuziantes. Resquíscios de uma era perdida da comédia pura, onde a lei do movimento dentro do quadro traduzia rebentar a lógica. A reprise de Uma Noite na Ópera é uma das melhores coisas do ano.

Correio da Manhã
13/08/1969

 
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