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Hulot no tráfego

Quem conhece a obra de Jacques Tati sabia não só que ele e o maior comediante cinematográfico da atualidade; sabia também que o tráfego teria de ser um alvo certo - aliás já satirizado em alguns trechos e tomadas de Mon Oncle.
A sua carreira - de Jour de Fête, passando por Les Vacances de M. Hulot, Mon Oncle (estas duas, suas obras-primas), Playtime, até Traffic - assinala a irreversibilidade do método e da coerência. Foi o primeiro cineasta (em Tempos Modernos, Chaplin é um precursor parcial) a críticas sistemática e antidiscursivamente as loucuras do desenvolvimentismo e do pseudo progresso - o primeiro cineasta ecológico. E o seu personagem. Hulot, uma resposta desengoncadamente silenciosa, contundente, ao automatismo do comportamento humano.
Aí está em Traffic (ou As Aventuras de M. Hulot no Tráfego Louco), uma das facetas do suicídio ocidental: o bem-estar do carro acima do bem-estar do homem. O fenômeno é bem familiar entre nós, na Guanabara, onde, depois das buzinas no asfalto inteiramente ocupado, os carros invadem indiscriminadamente calçadas deixando os bípedes sem vez.
O ponto principal da obra de Tati é a sua estética de ruídos, desenvolvida em Traffic com grande acuidade. Não ficou apenas no óbvio descritivo das buzinas, mas voltou a explorar aqueles pequenos taques sonoros carregados de significação. Isto desde as cenas mais breves até a principal que é o fabuloso ballet de batida - os carros girando, meio no ralenti, e troncando trornbadas mútuas. E aí também está o seu melhor achado de humor visual, digno da antológica cena das janelas da casa que se acendem como dois olhos que se abrem, em Mon Oncle: trata-se do momento em que um dos carros acidentados (fusca) corre na mesma direção de que uma roda solta na sua frente, enquanto o capô do carro, abrindo e fechando, parece uma imensa boca a tentar comer a roda. Outro relance típico de humor formal, visual, é ver o bumbum do bebê, virado de costas no colo da mulher, dando a impressão de ser os lolobrígidicos seios desta última. Ou então, no final, Hulot que descia as escadarias do metrô, de guarda-chuva aberto, passando a ser levado para cima, de volta: pela multidão que subia com os guardas-chuvas também em riste.
Enfim a odisséla da ida Paris-Amsterdam de um carro de camping, com os acessórias mais inimagináveis, levado paradoxalmente por um caminhão velho, quase imprestável. Ou então, os solos insólitos de vários automóveis, aos olhos do público que visita a exposição internacional. Traffic, se não chega à altura dos dois grandes filmes de Tati, mantém o alto nível da carreira do diretor, que, sobretudo, como dizia Fernando Pessoa, "é raro e claro".

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