Quem ainda não viu As Máquinas Quentes pode fazê-lo sem grandes entusiasmos, porém sentindo a personalidade algo insólita do diretor Sidney J. Furie. Trata-se mais de um filme de típico apêgo norte-americano, ou seja, a volúpia do perigo e da velocidade, como até uma forma de contestação, bem como o relacionamento homem x veículo.
Little Fauss and Big Halsy - do título original - são dois corredores. O primeiro (mais uma boa encarnação de Michael J Pollard, que é candidato a ser um dos atores característicos por excelência, do cinema), de início, era apenas ajudante, mecânico, quase empregado do segundo (Robert Redford, exibindo o torso em giros permanentes de cintura e pegando, papando e soltando as moças pelos caminhos que levam às disputas de motocicletas). Depois, Little dá o seu grito de independência e passa a ser rival temível do ex-ídolo. Apanha, inclusive, algumas antigas namoradas do amigo, enquanto este havia se fixado com uma que engravidou (Lauren Hutton, em aparição muito boa).
Mas, vale no filme menos a sensação das corridas (que - ao contrário da maioria das fitas no gênero - é deixada pelo diretor num segundo plano de especulação motivisual), vale a pintura de certo tipo de comportamento deletério, da parte dos protagonistas corredores, em confronto com o estar decadente (como seus valores) de pessoas, como, por exemplo, os pais de Little (ele, o veterano Noah Beery Jr.), ridículos e caricatos. Sem cair no discursivo ou no simbolismo fácil, o filme propicia uma atmosféra válida no que tem de abafamento vivencial e alienação.
Sidney J . Furie parece ser um cineasta disposto a manifestar a sua personalidade em qualquer oportunidade. Nascido em 1933, começou a dirigir a partir de 1961, com The Snake Woman. Chamou a atenção em 1965, mediante The Ipcress File (Ipcress: Arquivo Confidencial), onde, consoante observou o crítico Andrew Sarris, tentou logo jogar de maneira intencionalmente anti-James
Bond.
Aqui, em Little Fauss and Big Halsy, realiza mais ou menos o mesmo, quase que transformando o momento das corridas em vinhetas entre os lances do verdadeiro filme que quis contar.
Não foi coroado de êxito, mas trata-se de obra de fato interessante em determinadas passagens. Ou irremediavelmente prejudicada por uma certa ânsia de bossumo ou pseudomodemismo, como o arremate final seco, de imobilização fotográfica do rosto de Robert Redford.
Última Hora
18/05/1972