Onibaba esteve aqui pela primeira vez a fim de ser exibida no I Festival Internacional do Filme, em 1965. Na época, a última hora, foi retirada da seleção japonesa. Fato inexplicável, porque, para a maioria das pessoas que assistiram a fita em sessão privada, era sério concorrente à gaivota, afinal repartida entre os Beatles (Help) e A Velha Dama Indígena. Depois, retornou ao Brasil para exibições comerciais. Começou, então, a odisséia burocrática de Onibaba. Alguns observadores consideraram-na imoral (seriam snibobos), a censura manteve-a proibida durante um longo tempo, até que – sem sabermos se com ou sem cortes – resolveu liberá-la. E, com esse happy-ending seria possível fazer um filme tragicômico sobre a trajetória brasileira de Onibaba.
O entrecho embora simples, selvagem, possui grande intensidade alegórica. Época medieval, durante a guerra pelo Império. Perto do rio, duas mulheres esperam a volta de um homem, que é marido de uma e filho da outra. Enquanto isso, vão saqueando os cadáveres de guerreiros que vem trazidos pela correnteza. Às vezes, chegam mesmo a matá-los. Um amigo do homem esperado, que retorna, auxilia-as na faina sinistra da luta pela sobrevivência. Entre ele e a mulher mais jovem nasce o desejo erótico, que a outra mulher busca reprimir e, ao mesmo tempo, participar. Até que, certo dia, aparece um guerreiro com uma máscara. É uma intervenção insólita e algo mágica dentro da trama. A mulher mais velha vai tentar roubar-lhe a máscara depois de atirá-lo num poço de grande profundidade.
Sem ser uma obra-prima ou fita de grande importância, aí está um dos melhores representantes do cinema japonês dos últimos tempos. O diretor, Kaneto Shindo, demonstra uma segurança a toda prova, mormente no trabalho junto aos atores – magníficos, sem exceção. A fita, praticamente, tem apenas quatro personagens e a tensão de sentimentos primitivos adensa-se entre eles. As cenas em que a mulher jovem quase que ganindo de prazer, corre pelo capim alto, ao encontro do amante são de força excepcional. E é exatamente esta uma das características de Onibaba – uma das maiores fitas realizada nestes anos, no tocante ao enfoque estético das seqüências eróticas (que, esperamos, a censura não tenha tido o cuidado de tesourar).
Correio da Manhã
23/04/1970