The Vinishing Point é resultado evidente da influência que filmes, como Easy Rider (Sem Destino), viriam fatalmente a acarretar. É também consequência de dois fatôres contigentes da nova tragédia americana, vincada em dois elementos teoricamente inconciliáveis: violência e liberdade. De um lado, o trauma de coisas, como sociedade de competição e superconsumo, guerra do Vietnã, conflito racial; de outro, o esfôrço permanente de garantir a democracia pura, o sagrado direito de informar e opinar, hoje em dia, pela direita ou pela esquerda, estuprado em tantas partes do mundo. Por isto, por causa da democracia, pode-se ainda, nos EUA, realizar a autocrítica, mais violenta; por isto, em decorrência, o seu cinema, após a derrocada do Código Hays e, em plano mais abrangente, daqueles comitês de atividades anti-americanas, tornou-se o mais livre de todos.
O moderno cinema norte-americano vem-se preocupando profundamente com a crise social e ambiental, que leva parcelas das gerações mais novas ao marginalismo: seja pela ação direta (terrorismo, protesto, guerrilha) ou pela omissão total (hippies, drogas, nomadismo permanente, onde as motos substituem os cavalos dos antigos personagens de faroeste). Ao contrário do que ocorre com Easy Rider, o protagonista desta Corrida Contra o Destino ainda não institucionalizou a sua marginalização. A alegoria. simbólica de sua luta contra o establishment - glosada e apoiada via rádio pelo cantor negro (Cleavon Little), como se fôsse o jogral de outrora que comentava o drama ou os feitos do herói - vem concretizada na disparada com o carro branco (talvez branco tal como os cavalos de mocinho) pelos estados de Nevada, Colorado, Califórnia, sem tomar conhecimento de qualquer norma de trânsito em matéria de velocidade. Pois a velocidade era uma espécie de sinônimo de liberdade. E só queria, como diz ao velha garagista. estar em São Francisco na segunda-feira. A Polícia inicia uma perseguição implacável, enquanto ele apenas encontra a ajuda dos pobres e marginais: hippies, negros ou aquele velho que caçava cobras (Dean Jagger, em mais uma boa aparição).

Fúria

A estrutura narrativa é a corrida permanente do carro, entrecortada por flash-backs abruptos do passado de seu piloto. A cinegrafia concebida pelo diretor Richard C. Sarafian é das mais efetivas e funcionais - a câmara sempre na posição mais aguda em matéria de significação antidiscursiva. Existem admiráveis long-shots do carro solitário nas estradas, planícies e deserto, em contraposição com o vigor das cenas de perseguição, dos entrechoques das carrosserias. Kowalski (Barry Newman), o protagonista, havia sido expert em corridas de baratinha , além de herói no Vietnã e, depois, expulso da Polícia por ter agredido um colega que tentava estuprar uma jovem que fumava maconha.
Só se combate a guerra com a guerra, disse a antiga namorada de Kowalski, antes de morrer afogada durante o idílio na praia. Por isso, Corrida Contra o Destino é fúria permanente acionada por Richard C. Sarafian, uma das melhorcs revelações de cineasta dos ultimos anos - aqui preciosamente auxiliado pela foto de Joseph A. Alonzo e a música de Jimmy Bowen. Quanto à hipple que gira nua, de moto, em volta do casebre, chama-se Gloria Texter.

Última Hora
27/11/1971