Mil pecados... Nenhuma virtude
Mille Pecati... Nessuna Virtú corresponde a um gênero de exploração do insólito, através do espetáculo cinematográfico, que vem se tornando comum, a partir da década de 1960. É o caso da série Mundo Cão (Mondo Cane) e outros. Os produtores depacham uma série de cameramen à volta do mundo; estes, convidados ou à espreita, registram aquilo que o público em geral não terá oportunidade de apreciar ao vivo. E há também os casos em que os próprios filmadores produzem e montam o seu material.
O gênero, evidentemente, vez por outra, propicia alguma obra de mais expressão. No atacado, entretanto, visa ao show e à excitação, mediante o exibir de fatos chocantes, escandalosos, anormais. Mil Recados... Nenhum Virtude, elaborado através de um razoável trabalho técnico, enquadra-se exatamente na hipótese mais comum. Deseja abordar, de modo documental, o tema, mais do que atual, da extrema liberação dos instintos e tendências sexuais, sejam na linha saudável (como do rito tradicional das môças da Finlândia, girando despidas na neve), como na mais aberrante, onde a imaginação atinge requintes de assustar o paganismo mais acadêmico.
REALIDADE
O fato é consumado ao nível internacional e tem suas raizes em diversos planos: social, religioso, psicanalítico, psicopático, biológico, político etc. Assim sendo, não é e nem jamais será, em si imoral - pois trata-se da realidade e, esta, só pode ser amoral. O que se pode considerar como imoral (ou desonesto) é o texto do filme, simulando combater as anormalidades e aberrações recolhidas pelos operadores, mas que são, elas mesmas, o objeto utilizado pelos produtores a fim de despertar a natural curiosidade do público e, assim, ganhar dlnheiro.
Essa fita, por exemplo, apresenta uma sequência de casamento entre dois
homossexuais, com oficiante, padrinhos, etc., enquanto o comentarista - voz off - condena a prática, perfaz índagações lancinantes a respeito do destino dos costumes e o público ri, Mas, pergunta-se: o que é mais imoral? aquele matrimônio ou quem o exibe, sob o biombo da hipocrisia, que é a caixinha dos produtores? Ou, em sentido mais lato, o que é mais imoral, a guerra ou o homossexualismo?
Assuntos como o desse filme ensejam, e sempre ensejaram, um enfoque válido: seja sob a ótica esteticista da euforia da explosão pagã, seja como um exame das condições do homem no seu meio. Aqui, há simplesmente o comercialismo estribado num esfôrço regular de fotografia e montagem. O diretor, Sergio Martino, assinou o. ponto e nada mais - pois o filme já era o que se programara: diversão pela diversão.
Última Hora
09/11/1971