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O moderno cinema italiano

O ponto de partida é o neorealismo com a sua crueza. Este movimento teve o seu início coincidinco e, logo após, condicionado por uma permanência ideological, firmada nas solicitações de uma realidade contigente do pós-guerra e, assim, núcleo gerador de motivações afins aos homens de cinema. A experiência vital intensiva, plasmando o sentimento do mundo em bases concretas, imediatas, permitia o estímulo qualificado ao pensamento atuante.
Contudo, dentro da dialética ideologia X produto, concernente à linguagem cinematográfica, seria, a princípio, uma notória constatação a discrepância entre o animus do criador e seu instrumento. Devido a fatores de ordem econômica, não existia a orientação do produto – critérios artesanais desenvolvidos no escopo de propiciar adequadamente uma efetividade aos recursos da sétima-arte. Não poderia se, como o foi o grande cinema soviético a eclodir na segunda década do século – “um cinema que faz tremer o mundo” – nascido também de imperaticos ideológicos simultaneous, mas, ao contrario, com todo um poderoso suporte artisanal, alimentando-se e, ao mesmo tempo, realimentando uma profunda fonte de teorizações. Nesse caso, tratava-se de uma escola, no sentido mais compacto do termo, que formulou consequencias mais drásticas à evolução de uma linguagem motovisual.
O cinema italiano ofereceu, separadamente, uma afirmação das condições de produto e das condições ideológicas, antes de chegar à atual fase de coesão. Na época do facismo, o estudo e a realização de filmes recebeu bastante impulso, tendo muitos de seus melhores cineastas então se formando. No entanto, devido à própria situação politico-social vigente no país, o instrumento não encontrava o estímulo naturalmente fundado, adequado ao seu melhor uso. Tivemos realizações de interesse, algumas de alto nível, porém a media deduzida não facultava a que o centro de produção viesse a se impor definitivamente. Três diretores conseguiram uma autêntica projeção de mérito para o tonus daquele período: Camerini, Blasetti e Genina. De 1922 (ascenção de Mussolini) a 1945 (fim da segunda Grande Guerra), o cinema italiano das grandes divas e dos espetáculos históricos transformou-se, em parte, e, embora a injustiça ou o incrível black-out sofrido nos livros da maioria dos historiadores deixou de ser o que a sua pujança, em estado latente, o permitiria.
Pouco antes do término do conflito mundial, duas fitas, em especial, já forneciam as origens de uma posterior constância neo-realística: “O Coração Manda” (Quatri Passi tra le Nuvolle), de Blasetti, e “Obesessão” de Visconti. A primeira, a exploração de uma espécie de tragicômico do cotidiano, em ritmo escorreito, mediante a utilização de poucos elementos – a estrutura dramatica, colorida, na superfície, pelo comportamento tipicamente popular dos personagens, num colloquial peculiar. Por seu turno, a segunda, já se consistia no primeiro grande monumento deste moderno cinema peninsular. De saída, uma aula à maioria dos renomados mestres do realismo noir francês. Isso, no critério de estilização e no tratamento e rendimento das chamadas cenas “fortes”. Todavia, Visconti foi mais longe, pois, dentro de uma história, sob o estigma da pura tragédia e de autoria de escritor estrangeiro (o americano James Cain), extraiu consequências, a partir do comportamento humano em contato-conflito com o meio ambiente, que vislumbravam todo um fenômeno sociológico de um desequilíbrio da infra-estrutura.
Logo depois, diretores, como Rossellini (“Roma Cidade Aberta” e “Paisà”), De Sica (“Sciuscia”, “Milagre em Milão” e duas obras antológicas: “Ladrões de Bicicletas” e “Umberto D”), Castellani (“Sob o sol de Roma”) ou Germi (“O Caminho da Esperança”), começaram a se afirmar. A pobreza de recursos causava um despojamento de materiais e, por conseguinte, de elementos. Na maioria dos cineastas, esse mencionado desponjamento, sem maiores vinculações racionalizadas a uma organicidade do produto, não chegava, portanto, a constituir um processo. Em “Ladrões de Bicicletas”, dentro de uma motivação ideological, provocada por uma tensão social contingente, e a partir de uma espécie de fenomenologia do objeto (a bicicleta), consumada pelo olho ativo e a visualização ritmica da câmara, ele encontra o seu coroamento functional. Ficou, praticamente, sendo o “clássico” dessa nova primeira fase – o neo-realismo puro – se, antes, já não figura entre os maiores de todo o cinema.
A perquirição reiterada das mesmas vertentes do cotidiano, sob as diversas fundamentações conteudísticas, trouxe, sem nenhuma nova concepção de processo, a exaustão do foco. De Sica, após e, virtualmente, no mesmo esquema rítmico, fez “Umberto D” e nunca mais voltou a atingir o mesmo teto. De todos, o que conseguira se manter, numa rara média de eficácia fôra Visconti – naturalmente, quem mais dominava e tinha consciência formativa de seu instrumento. Depois de uma satisfatória experiência com um afresco vigorosamente participante. “La Terra Trema”, realizou o admirável “Senso” (ensaio com a cor e estudo sobre os costumes e a decadência de uma classe), a adaptação do Dostoievski, de “Um rosto na noite” (a poderosa consubstanciação plástica, agora em preto e branco, decorrendo, em feliz ajuste isomórfico, paralela ao rítmo compassado dos planos e o desenvolvimento psicológico do entrêcho) e, finalmente o recente Rocco, ainda não exibido aqui.
Voltando a melhorar as condições de produção, o conhecimento do artesanato pode estratificar-se noutros terrenos de especulação. Em concomitância, a influência do que se fazia no estrangeiro, principalmente em Hollywood. Outros diretores começaram a pontificar e, aqui, emerge o nome de Fellini, quem, através de seu ultimo filme, La Doce Vita, trazendo novas dimensões aos efeitos da linguagem, recoloca o cinema italiano, em situação, como antes se deu com “Ladrões de Bicicletas”.
De formação cristã-chaplinesca, Fellini, que já colaborara no roteiro e direção com vários cineastas de destaque, estreou como único responsável de uma película já com o indiscutível êxito: “Abismo de Um Sonho” (Lo Sceicco Bianco). Só, por essa obra, tínhamos a corroboração das extraordinários qualidades de realizador e, na esfera do anedótico, uma indiscutível capacidade de efabulação. Sem possuir uma ideologia caracterizada pela comunhão com as premissas sociais de uma situação concreta, a participação ativa de um De Sanctis, ou de parte da obra da dula de Sica-Zavattini, ele está mais voltado para um humanismo generalizante, onde as abstrações de um rotulário habitual (fraternidade, bondade, autenticidade, etc.) encontram uma espécie de sancionamento místico na perdição e ou recuperação de seus personagens. Fellini, partindo de uma situação objetiva, traz-lhe condições extemporâneas de exame e definição.
A exemplo da melhor fase de outro diretor, o americano John Huston, e malgrado em sentido diferente, os tipos humanos que cria são, via de regra, marginais. É o decorrente de fitas, como “Os Boas Vidas” (I Vitelloni), “La Strada”, “A Trapaça” (II Bidone) e “Noites de Cabiria”. Dessas, foi “La Strada” quem melhor e com maior teor de impacto delineou a estatura de um artista e as largas possibilidades de um artesão, descerrando, em elevada voltagem, o poder catártico de seus recursos. Por outro lado, a renitente feição chaplinesca e o abuso de incursões repetidas no mesmo ângulo de uma problemática que, através de “II Bidone” e “Cabiria”, provocaram um certo declive em sua trajetória, pareciam uma pausa forçada ou tomada de fôlego para a admirável monumento barroco, “Lá Doce Vita”. Em lugar de um princípio de ordenação linear, a apreensão vertical de um encadeamento de cenas, temos o método de justaposição, a apreensão horizontal, a polivalência dos elementos. Constitui também a maturidade integral – fundo-forma – da concepção do diretor: a libertação de uma influência, cujos efeitos não mais se faziam positivos (Chaplin), a utilizacão functional da tela panorâmica (apesar de não obdecer a um processo revolucionário como o de “Lola Montez”), noção dinâmica do corte e do enquadramento. Torna-se fácil observar que, omitindo o personagem catalizador de Marcello, a ordem cronológica de quase as sequências poderia ser modificada, sem prejuízo para o mesmo objetivo final.
Ao lado de homens, como Fellini Visconti, Rossellini (reabilitando-se com “II Generale Della Rovere”), De Sanctis, Germi, Castellani ou Lattuada, surgem alguns novos promissores, sem levarem qualquer ascendência daquele período do neo-realismo cru. É constatar o vigor de obras da estirpe de “A Longa Noite de Loucuras” (La Notte Brava) e “O Belo Antonio”, de Mauro Bolognini, bem consciente do métier, poi strata-se de duas películas de esquemas rítmicos diversos entre si, e funcionais aos seus respectivos contextos específicos. Em paralelo, temos Damiano Damiani, com “O Batom” (“II Rosseto”), uma realização seguindo, até certo ponto, uma linhagem norte-america, porém, denotando uma assimilação dinâmica das virtualidades de um tipo de linguagem, sem tombar na mera diluição de um estilo.

Correio da Manhã
21/01/1961

 
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Revista Leitura 30/11/-1

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