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A Hora do Lobo

Obras básicas na filmografia de Ingmar Bergman já eram Juventude (Sommarlek), Noites de Circo (Gyrklanas Afton), Sorrisos de uma Noite de Amor (Sommarnattens Leende) e Os Morangos Silvestres (Smulstronstalet). Só essas, dentre as que vimos (e algumas das não assistidas, como Tôdas Estas Mulheres, Os Comungantes ou Atrás do Espelho, podem ser revelações do maior interêsse) já consagravam o homem de cinema. Depois, veio o impacto de Persona - fabuloso visualizar da fusão entre os sêres, as máscaras, existenciais, meditação sobre o ato de criar, o filme sôbre o filme - que ficou sendo o seu maior filme até o alvorecer dessa inacreditável Hora do Lôbo (Vargtimmen), tranquilamente um dos monumentos da história do cinema.
Só como fita de hcnor, A Hora do Lôbo já seria insuperável: nem Dreyer (Vampyr) ou Murnau (Nosferatu) chegaram a tanto em matéria de catárse do terrível. Mas não é apenas o horror anedótico, descritivo é, em essência, o nosso horror, o horror metafisico – vencendo todas as etapas da magia, do onirismo, da psicologia, do expressionismo, da bruxaria. De novo, como em Teorema, podemos invocar os anjos de Rilke, o belo também como escala para o tenebroso - só que aqui, em vez do personagem, é Bergman o próprio anjo.

O ôlho de Mônica. Em uma fita já antiga, Monika e o Desejo (Sommared Med Monika), Bergman havia descoberto o recurso de romper com um dos elementos da gramática formal do filme e fazer com que a protagonista (Harriett Anderson) olhasse para a câmara e, em decorrência, para o espectador - isto num memorável close-up. Agora, em A Hora do Lôbo, logo no início e no desfecho, é a vez da Liv Ullman encarar-nos demoradamente, começando e acabando de verter suas impressões e dados em tôrno dos acontecimentos que acarretaram o desaparecer do marido da personagem que interpreta (Max Von Sidow), o pintor angustiado heideggerianamente com o ser e o tempo. Ao contrário da fórmula marcusiana, Marx Freud, a fórmula Heidegger-Freud nos conduz ao meditolhar para dentro do ser, centrírpeto e, não, centrífugo. E há muito que ver - antes de Freud (eu a ciência), o transe da magia já o demonstrara.

E também a arte, que nasceu (Fisher) com a descoberta do instrumento. Por isso também, Bergman na Hora do Lôbo, recorre ao cinema auto-referencial (essa fita começa com o início das filmagens e termina com o fim das filmagens, com os atôres e o próprio diretor circulando entre os técnicos). E, ao contrário de Polanski, que, como no caso de Rosemary's Baby, opta pelo distanciamento do ateu, frente ao assunto do sobrenatural, Bergman mergulha no mesmo sobrenatural na opcão do ateu que quer escarrar os anjos. Para ele, o ateísmo não é um estar, como em Polanski, mas a meta intelectual, cuja chegada exige o enfronhar no inferno do descontrôle mental e emocional (Freud, surrealismo).
Assim como outros dois monumentos tão hereterogêneos do cinema moderno - Uma Odisséia no Espaço ou Teorema -, A Hora do Lôbo é a obra da procura constante, onde o mêdo da dúvida (pois o racionalismo é uma opção formal) tem a cor do horror. Só que o sueco "viaja" para dentro. E essa viagem até os fantasmas psíquicos e metafísicas também gera o choque cultural. Existe muita analogia entre a chegada do astronauta de Kubrick e Clarke às galáxias e as incursões de Johan, o pintor, ao fundo de si mesmo. Só que, em 2001, o choque cultural é de natureza epistemológica, enquanto que agora, em Bergman, é de natureza ontológica. E, com isso, a formulação simbológica da inquirição ao além do além do entre o bem (já caracterizado na figura e nome da esposa - Alma) e o mal (a amante, Verônica Vogler = abutre).

No delírio do transe especulativo quase sempre em 1º plano, sequências imrotas, onde beleza msscla-se dialeticamente com o referencial de horror, violência, anormalidade. A mais inolvidável entre todas é o encontro com o menino, quando o pintor está pescando, quando a aura de claridade em tôrno do garôto, combinada com a posição fálica do anzol, confere de pronto a ilação homossexual. Tudo na foto é alto contraste, com a cintilação encantatória do pequeno corpo que se estende nas rochas. O anjo que será destruído a golpes rudes, após haver-se agarrado ao pescoço de Johan. Também notável, a cena em que, sob os auspícios do sobrenatural, irá ele se reencontar com Verônica (lngrid Thulin}, nua e morta, depois rediviva, para possuí-la, Johan com o rosto maquilado, ao som das risotas dos bruxos.
Muito ainda há a dizer-se sobre esta fita memorável e a perguntar, se, consumando a referência ao próprio filme, não estaria Bergman anunciando que tudo não passa de arte ou criação - o mero ludismo - ao fazer que tudo se passe entre as vinhetas de abertura e fechamento, correspondentes à própria filmagem. Mas no meio do encerramento e apagar de luzes do estúdio, issere-se brevemente a imagem e as gargalhadas de Verônica e dos sêres estranhos. Moral alógica da fábula: só as dúvidas nos salvam (ou nos perdem) das nossas certezas. A Hora do Lôbo, não apenas a hora do filme; mas, talvez a hora da verdade .

Obras básicas na filmografia de Ingmar Bergman já eram Juventude (Sommarlek), Noites de Circo (Gyrklanas Afton), Sorrisos de uma Noite de Amor (Sommarnattens Leende) e Os Morangos Silvestres (Smulstronstalet). Só essas, dentre as que vimos (e algumas das não assistidas, como Tôdas Estas Mulheres, Os Comungantes ou Atrás do Espelho, podem ser revelações do maior interêsse) já consagravam o homem de cinema. Depois, veio o impacto de Persona - fabuloso visualizar da fusão entre os sêres, as máscaras, existenciais, meditação sobre o ato de criar, o filme sôbre o filme - que ficou sendo o seu maior filme até o alvorecer dessa inacreditável Hora do Lôbo (Vargtimmen), tranquilamente um dos monumentos da história do cinema.
Só como fita de hcnor, A Hora do Lôbo já seria insuperável: nem Dreyer (Vampyr) ou Murnau (Nosferatu) chegaram a tanto em matéria de catárse do terrível. Mas não é apenas o horror anedótico, descritivo é, em essência, o nosso horror, o horror metafisico – vencendo todas as etapas da magia, do onirismo, da psicologia, do expressionismo, da bruxaria. De novo, como em Teorema, podemos invocar os anjos de Rilke, o belo também como escala para o tenebroso - só que aqui, em vez do personagem, é Bergman o próprio anjo.

O ôlho de Mônica. Em uma fita já antiga, Monika e o Desejo (Sommared Med Monika), Bergman havia descoberto o recurso de romper com um dos elementos da gramática formal do filme e fazer com que a protagonista (Harriett Anderson) olhasse para a câmara e, em decorrência, para o espectador - isto num memorável close-up. Agora, em A Hora do Lôbo, logo no início e no desfecho, é a vez da Liv Ullman encarar-nos demoradamente, começando e acabando de verter suas impressões e dados em tôrno dos acontecimentos que acarretaram o desaparecer do marido da personagem que interpreta (Max Von Sidow), o pintor angustiado heideggerianamente com o ser e o tempo. Ao contrário da fórmula marcusiana, Marx Freud, a fórmula Heidegger-Freud nos conduz ao meditolhar para dentro do ser, centrírpeto e, não, centrífugo. E há muito que ver - antes de Freud (eu a ciência), o transe da magia já o demonstrara.

E também a arte, que nasceu (Fisher) com a descoberta do instrumento. Por isso também, Bergman na Hora do Lôbo, recorre ao cinema auto-referencial (essa fita começa com o início das filmagens e termina com o fim das filmagens, com os atôres e o próprio diretor circulando entre os técnicos). E, ao contrário de Polanski, que, como no caso de Rosemary's Baby, opta pelo distanciamento do ateu, frente ao assunto do sobrenatural, Bergman mergulha no mesmo sobrenatural na opcão do ateu que quer escarrar os anjos. Para ele, o ateísmo não é um estar, como em Polanski, mas a meta intelectual, cuja chegada exige o enfronhar no inferno do descontrôle mental e emocional (Freud, surrealismo).
Assim como outros dois monumentos tão hereterogêneos do cinema moderno - Uma Odisséia no Espaço ou Teorema -, A Hora do Lôbo é a obra da procura constante, onde o mêdo da dúvida (pois o racionalismo é uma opção formal) tem a cor do horror. Só que o sueco "viaja" para dentro. E essa viagem até os fantasmas psíquicos e metafísicas também gera o choque cultural. Existe muita analogia entre a chegada do astronauta de Kubrick e Clarke às galáxias e as incursões de Johan, o pintor, ao fundo de si mesmo. Só que, em 2001, o choque cultural é de natureza epistemológica, enquanto que agora, em Bergman, é de natureza ontológica. E, com isso, a formulação simbológica da inquirição ao além do além do entre o bem (já caracterizado na figura e nome da esposa - Alma) e o mal (a amante, Verônica Vogler = abutre).

No delírio do transe especulativo quase sempre em 1º plano, sequências imrotas, onde beleza msscla-se dialeticamente com o referencial de horror, violência, anormalidade. A mais inolvidável entre todas é o encontro com o menino, quando o pintor está pescando, quando a aura de claridade em tôrno do garôto, combinada com a posição fálica do anzol, confere de pronto a ilação homossexual. Tudo na foto é alto contraste, com a cintilação encantatória do pequeno corpo que se estende nas rochas. O anjo que será destruído a golpes rudes, após haver-se agarrado ao pescoço de Johan. Também notável, a cena em que, sob os auspícios do sobrenatural, irá ele se reencontar com Verônica (lngrid Thulin}, nua e morta, depois rediviva, para possuí-la, Johan com o rosto maquilado, ao som das risotas dos bruxos.
Muito ainda há a dizer-se sobre esta fita memorável e a perguntar, se, consumando a referência ao próprio filme, não estaria Bergman anunciando que tudo não passa de arte ou criação - o mero ludismo - ao fazer que tudo se passe entre as vinhetas de abertura e fechamento, correspondentes à própria filmagem. Mas no meio do encerramento e apagar de luzes do estúdio, issere-se brevemente a imagem e as gargalhadas de Verônica e dos sêres estranhos. Moral alógica da fábula: só as dúvidas nos salvam (ou nos perdem) das nossas certezas. A Hora do Lôbo, não apenas a hora do filme; mas, talvez a hora da verdade .

Correio da Manhã
09/10/1969

 
Uma Odisséia de Kubrick
Revista Leitura 30/11/-1

As férias de M. Hulot
Jornal do Brasil 17/02/1957

Irgmar Bergman II
Jornal do Brasil 24/02/1957

Ingmar Bergman
Jornal do Brasil 03/03/1957

O tempo e o espaço do cinema
Jornal do Brasil 03/03/1957

Ingmar Bergman - IV
Jornal do Brasil 17/03/1957

Robson-Hitchcock
Jornal do Brasil 24/03/1957

Ingmar Bergman - V
Jornal do Brasil 24/03/1957

Ingmar Bergman - VI (conclusão)
Jornal do Brasil 31/03/1957

Cinema japonês - Os sete samurais
Jornal do Brasil 07/04/1957

Julien Duvivier
Jornal do Brasil 21/04/1957

Rua da esperança
Jornal do Brasil 05/05/1957

A trajetória de Aldrich
Jornal do Brasil 12/05/1957

Um ianque na Escócia / Rasputin / Trapézio / Alessandro Blasetti
Jornal do Brasil 16/06/1957

Ingmar Berman na comédia
Jornal do Brasil 30/06/1957

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