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A Via Lactea

Luiz Bunñel: cêrca de meio-século de cinema, como um dos cineastas mais discutidos, imitados, entronizados. Do surrealismo do Chien Andalou e L' Age D'Or, até esta Via Láctea (com o estranho título para o Brasil de O Estranho Caminho de São Tiago), é tôda uma carreira radicalista, com os altos e baixos de quem exatamente não se conforma, não aceita escolas nem as obrigações formais da coerência.
Se, em nossa opinião, Bunñel talvez jamais tenha ido mais alto do que o antigo L'Age D'Or, La Voie Lactée pode ser, no entanto, o seu maior filme, logo abaixo daquêle. Pelo menos, fica ern plano nunca inferior a obras do quilate de O Anjo Exterminador e A Bela da Tarde. Enfim, um dos melhores filmes dos últimos anos.
Não sabemos se os 103 minutos de projeção-peregrinação, valorizados pela ótima fotografia de Christian Matras, permanecem intatos, dadas as atividades da censura que, desde a saída do sr. Wilson Aguiar, retorna a uma fase de evidente intolerância (onde estão Z, de Costa Gavras, Zabriskle Point, de Antonioni, ou o expert, em Bridge, Omar Sharif, fantasiado de Che Guevara?). O que se nota, agora em Bunñel é uma vontade da procura, através de uma viagem histórica sem as regras do espaço e do tempo, onde a abertura para a dúvida se sobrepõe aos efeitos das heresias e à fúria dos dogmas dos antitodos-os-valores-aceitos.
A técnica, então, constitui um desdobramento do método apresentado em A Bela da Tarde (Belle du Jour), com o rompimento dos critérios imediatistas da lógica do relacionamento entre as sequências. Por isso mesmo, pela temática abrangente em face do campo referencial, esse filme reaproxima-se de L’Age D'Or, despojado, contudo, do delírio da contracivilização, na época, vazado no processo surrealista. Talvez mais condizente com a idade do diretor, A Via Láctea é mais plácida, tem mais distanciamento, mais intelectualizada, quando o savoir faire alia-se à reflexão bem impostada, ou seja: encanta e faz pensar. Dois maltrapilhos encetam uma peregrinação a Santiago de Compostela, iniciando-se a caminhada pelas auto-estradas da França. Durante o trajeto, a noção de tempo real começa a se diluir e são testemunhas de cenas ou cerimônias insólitas. Há também, em paralelo, a peregrinação e ceia de um Cristo informal e desinibido, acompanhado dos amigos. Assistem os dois a uma missa católica que termina em orgia pagã, correspondente ao ritual de uma seita herética da Espanha, do século IV. Vêem a auto-imolação, na cruz, de uma freira, um duelo de espada, provocado pela mera divergência de idéias, entre dois teólogos do século XVI, aparece o marquês de Sade dizendo as suas verdades a uma vítima.
Em tudo e por tudo, nessa realização, o sentido de fluência, de limpidez dos gestos e olhares, é uma lição. A elisão da velha pontuação cinematográfica, que era usada como modo de ligar ou preparar psicologicamente a passagem do normal para o fantástico ou irreal, em lugar de conferir sensações de ritmo truncado, solavancos ao transe de apreensão da obra pelo espectador, atua com precisão em favor de uma unidade sem jaça. Sem dúvida, um dos melhores do ano.

Correio da Manhã
25/05/1971

 
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