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Fellini & Poe

O último e admirável episódio de Histórias Extraordinárias demonstra, entre outras coisas, que Fellini, dentro do paradoxo de modernizar a adaptação, foi o cineasta que, até hoje, melhor entendeu o gênio de Edgard Allan Poe. Poderia abrir-se exceção para Epstein e Corman, em suas interpretações mais lineares de The Fall Of the House of Usher. Fellini, no entanto, conseguiu concretizar a proeza de realizar um filme que o próprio Poe poderia ter feito, caso vivesse nos tempos atuais. Ai reside um dos seus principais méritos, nessa obra-prima que ficou sendo Tobby Dammitt.
É certo que, dentro da encomenda do último episódio, também o filme sôbre o cinema, houve o ensejo para o prolongamento da saga felliniana - a crítica de um mundo caricato, grotesco e decadente. E, o apêlo ao fantástico - uma das marcas permanentes de Poe - funciona no sentido de facilitar a cunhagem barroca do fluxo de imagens. Pretexto bem sucedido a fim de liquidar com a fatuidade do mundo do cinema e da televisão, do universo de competição à luz dos refletores que dão a glória cintilante e passageira. Um mundo de monstros que são as mulheres vestidas e maquiladas, os animadores, a publicidade, os holofotes, os produtores, os atôres, em suma, a engrenagem do sucesso.
E, já que surge em primeiro plano na história, monstro maior e autoconsciente é o protagonista, Tobby; representado através de uma caracterização estupenda de Terence Stamp. As vêzes, o seu vulto sobressai como o do próprio Poe. A degenerescência do ator, pelo álcool, pela droga, pela superestliização do comportamento, resulta naquela figura amarelecida, exangue e, ao mesmo tempo, com arroubos de alucinação.
O produto do meio explode contra o ambiente e, quando toma posse da ferrari, emergem na noite os faróis do automóvel como os olhos de um monstro extraterreno – da fauna de Poe. Assim, ruge o motor, como se rugisse o monstro, e, na pausa para fôlego, antes do mergulho decisivo no abismo, torna-se notável o momento em que Terence dá um berro lancinante, berro que é desespêro e libertação.
Fellini, evidentemente, opera com símbolos e metáforas, Opera na faixa do alegórico. No início, quando o avião está chegando ao aeroporto, o tom vermelho da ambiência é praticamente aquêle da descida aos infernos. Depois, o escuro arroxeado do programa de gala, com os lances de côres e luzes - barroco feérico - onde os sêres humanos já são fantasmas. A morte, mulher linda, vem e convoca Tobby. E, na mente dêle, perpassa, até o fim, a imagem do demônio, como uma menina loura acionando a bola. O contraste de recorrer à beleza para encarnar a fatalidade é lógico, no momento em que vida se tornou macabra. Fellini ilumina.

Correio da Manhã
09/04/1969

 
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