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Uma comédia em cada vida

Mais uma realização, englobando uma série de histórias, nos chega, proveniente da Itália, sendo que, dessa vez, foi Pirandello o autor escolhido.
O assim denominado conto cinematográfico, que de uns tempos para cá está ficando na moda em todos os grandes centros de produção, exige aparentemente uma maior eficácia do fator "script": economia de linguagem, precisão no uso do detalhe acessório, pois não há muito tempo para um repisamento simbólaico, principalmente quando, como no caso de "Uma Comédia em Cada Vida", as narrativas não possuem nenhum ponto de referência em comum. Em uma película como, por exemplo, "Enquanto as Mulheres Esperam", de Ingmar Bergman, o problema é diverso, já que as suas histórias divergem ou convergem para um núcleo radial, compondo, por conseguinte, um todo que deverá atuar sôbre a assistência – mantém um constante estado de fluxos e refluxos para um mútuo abastecimento no desenvolvimento da linha temática principal. Por outro lado, no exemplo em foco, funciona apenas uma equipe responsável por todo o celulóide.
"Uma Comédia em Cada Vida" apresenta quatro partes autônomas, entregues a diferentes equipes, cada qual devendo ser julgada em separado.
De tôdas, justamente, a mais bem realizada é a que possui o argumento menos interessante, o que vem outra vez provar a enorme transcendência para o sucesso de um filme do complexo "script" realização. Trata-se de "O Leque", dirigido por Mario Soldati, com Miriam Bru na protagonista. Responsável por uma das melhores produções italianas aqui exibidas nesses três derradeiros anos, "La Provinciale" - extraída do romance de Morávia e na qual Gina Lollobrigida teve o mais eficiente desempenho de sua carreira, Soldati, dono de um estilo próprio e maturo, conferiu ao pequeno motivo tôda a fluidez e exatidão necessárias para que o mesmo se desenvolvesse com leveza até o desenlace. Justamente, o critério de estilização empregado para a ambiência em que transcorre o conto revela admirável adequação com o ritmo da ação psicológica do mesmo. Desde o início, com o aparecimento do cego e do seu acompanhante ao violão, possuidor de invejável expressividade fisionômica, passando pelo velho no banco da praça pela parada, até o vendedor de leques, o poder de climatização evidenciado pelo "metteur en scène" é sumamente preciso.
Muito boa também é a interpretação de Miriam Bru, correspondendo a tôdas as nuances do papel com grande sugestividade, pois o diálogo marca somente o acessório e suas reações mais incisivas, bem como a mudança de atitude são expressas através da mímica.

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O episódio do diploma, o mais famoso de todos entre os que foram escolhidos para essa fita, se constitui numa realização completamente pálida em efeitos de qualquer
natureza.
Luigi Zampa, um dos bons diretores egressos do grupo neo-realista, mostra-se totalmente apático, não imprimindo vivacidade a sequência alguma. O mesmo também se poderá dizer de Totó, que, nesse filme, talvez tenha apresentado a sua mais inócua performance. Repete o consagrado ator uma série de caretas já exaustivamente repisadas e que não obedecem a qualquer solução de funcionalidade.
Existem alguns bons tipos, como o do juiz por exemplo, extremamente mal aproveitados.

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A pior parte, entretanto, ainda não é a de Zampa-Totó e sim a que foi dirigida e interpretada por Aldo Fabrizzi. Êste, do qual recentemente assistimos "O Reverendo e o Ladrão", realização pobre com raros momentos de comicidade, revela-se outra vez muito "verde" ainda para a direção. Assim como a película anterior, êsse episódio transcorre linearmente, destituído de qualquer valorização que esja facultada pelos elementos artesanais, e vazado em flagrante monotonia, a qual o “regisseur” em lugar de procurar evitar, mais alimentou, principalmente na extensa cena inicial em que êle experimenta o traje para o casamento.
O toque de originalidade que continha o argumento foi completamente absorvido por um clima pesado, que se arrasta com excessiva dialogacão. Um têrço do celulóide, seguramente, foi gasto à-tôa em pleonasmos ou coisas inúteis.
Fabrizzi surge bem como sempre no protagonista. Doou no entanto a fita quase que inteiramente a si próprio e foi êsse um dos erros capitais que envolvem a sua realização. Lucia Bosé aparece muito pouco e Walter Chiari, de tal forma, que qualquer extra cumpriria com facilidade o seu role.

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A primeira história, sob a batuta de Giorgio Pastina, se consuma numa realização regular. De novo pode-se denotar a falta de vivacidade no que concerne ao seu ritmo ou um colorido mais expressivo que se imprimisse às diversas cenas. Porém, os tipos são engraçados e muito bem caracterizados, merecendo Prampolini referência especial, como o homem que fica prêso dentro da jarra.
Aqui também os efeitos de caráter plástico, baseados no claro-escuro, apresentam qualidades na funcão de caracterizar o que de bizarro-alucinante marca o curioso evento naquela noite de tempestade no campo.

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Sem falarmos de OphuIs, Duvivier ou Bergman, muita coisa de bem melhor já foi levada a cabo em filmes do gênero. Para tanto, basta recordar as produções inglêsas lançando contos de W. Somerset Maugham, escritor bem inferior a Pirandello, ou no próprio cinema italiano, Blasetti, com "Altri Tempi" e "Nostri Tempi”.
"Uma Comédia em Cada Vida" não acrescenta nada ao ciclo. Extraída uma média qualitativa dos quadro episódios, pode ser considerada uma película sofrível, na qual se projeta, sozinho, Mario Soldati em mais uma insofismável demonstração de sua classe.

Jornal do Brasil
11/08/1957

 
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Revista Leitura 30/11/-1

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Ingmar Bergman
Jornal do Brasil 03/03/1957

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Ingmar Bergman - IV
Jornal do Brasil 17/03/1957

Robson-Hitchcock
Jornal do Brasil 24/03/1957

Ingmar Bergman - V
Jornal do Brasil 24/03/1957

Ingmar Bergman - VI (conclusão)
Jornal do Brasil 31/03/1957

Cinema japonês - Os sete samurais
Jornal do Brasil 07/04/1957

Julien Duvivier
Jornal do Brasil 21/04/1957

Rua da esperança
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A trajetória de Aldrich
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Um ianque na Escócia / Rasputin / Trapézio / Alessandro Blasetti
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