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Despir os Tabus

Antigamente, era uma praxe reservada às portas de engraxate. Hoje, pelo menos nas capitais civilizadas, as publicações que apresentam o nu feminino estão disseminadas pelas bancas de jornais e livrarias, graças à libertação promovida pela inteligência, que arromba as muralhas moralistas formadas pelos pseudodefensores dos "costumes". É também o reflexo do progresso tecnológico, aliado à revolução empreendida por uma geração, no âmbito internacional, e que torna alienante o conceito de pecado.
Mas não se trata apenas de nudez, sexo, erotismo. As principais publicações que utilizam êsses ingredientes são extremamente cultas ou sofisticadas e - nelas – juntamente com as fotos, desenhos ou reproduções de quadros de mulheres despidas (algumas, são atrizes famosas ou manequins bem conhecidos), surgem matérias versando os mais diversos assuntos: humorismo, comics, cartoons, política, literatura, artes plásticas, cinema, música popular, ciência, economia. Pode-se dizer que, como instituição, a precursora dessa modalidade de publicações (e, até hoje, ainda não superada por nenhuma delas), é a revista Playboy, cujo dono e diretor, Hugh Hefner, constitui uma espécie de potentado do luxo e do prazer, vivendo em seu Xanadu moderno, de onde, aliás, raramente sai. O signo de Playboy é um coelho e, com orelhas de coelho, ornam-se obrigatoriamente muitas das hostess ou garçonettes nas invejadas festas e recepções do novo Kubla Khan. O prestígio da revista de Hefner é imenso; até hoje, a quase totalidade das artistas de cinema que desvendou ao público a sua nudez em papel impresso (luxuoso e habitualmente colorido) somente o fêz_em suas páginas. E já se consiste num verdadeiro all star cast: Jayne Mansfield (a precursora e que retomou em várias edições até quê, em homenagem à sua morte, HH organizou-lhe uma restrospectiva em número especial), Anita Ekberg, Kim Novak, Úrsula Andress (também presente em mais de uma oportunidade), Stella Stevens (que também bisou sua nudez no último número deste janeiro de 1968), Susan Strasberg, Mammie Van Doren, Sylva Koscina, Jane Fonda, Elke Somer. Enfim, vai-se tornando glória, prêmio ou etapa forçada, pousar despida em Playboy.
Na sua esteira, usando basicamente a mesma concepção estrutural, foram surgindo, em diversos países, inúmeras revistas no mesmo sentido (algumas, é verdade, de intuito primordialmente sexsensacionalista). De qualquer modo, lá estão, nos Estados Unidos, Cavalier, Man, Men Only, Clyde, See ou Schwank, na Inglaterra, Penthouse ou Mayfair, na Alemanha, Privat ou Club, na França, Lui ou Plexus, na Itália, Men ou Playmen (agora, vítimas de ataques de Osservatore Romano e do próprio Papa), na Argentina, Sir, e, aqui no Brasil, apareceu o Fairplay, ainda muito pudico.
É notável a contribuição cultural já fornecida por Playboy, não só na desmistificação do tabu do sexo, como em outros setores, a começar, pelo arrôjo e inovações de paginação, a passar pelas notáveis histórias em quadrinhos de Little Annie Fannie, e pelo debate de idéias; acarretado por entrevistas com personalidades da maior importância, em vários campos: Bertrand Russel, Arthur Schlesinger Jr., Mihelangelo Antonioni, Timothy Leacy (pai do LSD), Orson Welles, o promotor Jim Garrison, Norman Mailer, Fidel Castro etc. E o debate com os leitores, através da imensa correspondência, é o mais livre e a_vançado possível (os pudicos diriam “ousado"): adultério, homossexuahsmo, pílula, lesbianismo, abôrto, psicodélicos (ou "psicodelícias). É uma demonstração, inclusive, do bouleversement neuro-revolucionário da sociedade norte-americana. E o arrôjo temático haveria de encanecer fulminantemente muitas vocações de censor: na revista (também norte-americana) Clyde, de março de 1966, por exemplo, foi publicado um artigo, sob o título Homosexual Premise of Christianity.
Na França, Lui constitui um mensário de luxo, também algo pudico na apresentação das mulheres, com a maioria de artigos, contos e entrevistas bem abaixo do nível Playboy, porém com algumas contribuiçoes notáveis no terreno do humor e com soluções gráficas excelentes. Bem superior lhe é o bimensal Plexus, editado pelo grupo (e no mesmo estilo e formato) da revista Planete, do qual saíram até hoje onze números. O seu slogan é “la revue que decompléxe". Cada exemplar oferece entrevistas de interesse, colaborações valiosas e dá uma grande ênfase ao humor além do erotismo, é claro. Ao lado disso um pouco de surrealismo e ciências ocultas (êste último tema um do pratos fortes de Planete). Plexus que também oferece exibições de experimentação e virtuosismo fotográfico com o nu, produzindo inclusive uma modalidade de comics, mediante fotografias, com mulheres despidas, science-fiction, mistério e sexo, e uma das publicações mais instigantes e refinadas que se conhece.
Penthouse, na Inglaterra, chega a ser mais agressiva do que Playboy na exibição do nu, porém obtém, menor sucesso porque as pacientes dos fotógrafos, amiúde, são pessoa desconhecidas. Ao luxo da publicação, associa-se o bom nível dos artigos e reportagens e também algo do humor, onde já brilhou o brasileiro Ziraldo. Na Itália, Men, ao contrário, da maioria de suas congeneres, é um semanário e de tamanho tradicional de revista, como L’Europeo. Apresenta algumas reportagens de escândalo e sensacionalismo, mas, em contrapartida, possui boas matérias ou seções fixas. E, além do ingrediente-chave começou a publicar em série um dos melhores comics já concebidos (e em cores ótimas), intitulado Bisex, personagem com indumentária à la Capitão Marvel, advindo de outro planêta e que, como o nome indica, parece dotado do privilégio, quantitativo de possuir dois sexos .
O que representa êsse eflúvio e publicações? No mundo capitalista ocidental, lideres religiosos, censuras e polícias estão permanentemente com ôlho e alça de mira; conjugados em direção a elas para o tiro repressor. O establishment cristão tenta reagir ao poder pagão, que ressurge avassalador, é verdade que fundido com o humanismo que é a herança básica cristã. Esse poder pagão, com a eclosão da máquina, com a projeção de Beatles, beatniks, hippies, vietniks, psicodélicos, traz à frente a mensagem da liberdade essencial do homem que deve cunhar uma nova civilização. No fundo, o grande conteúdo lastreado por essas revistas é a própria liberdade em tôda a sua amplitude. E, por isso, em países industrializados, elas só são reprimidas inteiramente quando o regime é totalitário. "Nem só de pão vive o homem"; muito menos viverá só de ''nãos".

Correio da Manhã
12/01/1968

 
Wiener ou Cibernética
Correio da Manhã 12/04/1964

OP X POP uma opção duvidosa
Correio da Manhã 02/10/1965

Mitos políticos
Correio da Manhã 31/10/1965

Cristãos & Ocidentais
Correio da Manhã 22/12/1965

Moral & Salvação
Correio da Manhã 13/01/1966

Semântica & Nacionalismo
Correio da Manhã 25/02/1966

Ruínas de Conímbriga
Correio da Manhã 19/10/1966

Coimbra: canção e tradição
Correio da Manhã 09/11/1966

Beatnicks: protesto solitário
Correio da Manhã 10/05/1967

Os filhos que devem nascer
Guanabara em Revista nrº7 01/07/1967

Despir os Tabus
Correio da Manhã 12/01/1968

Ninguém ri por último nas fábulas do povo
Revista do Diner\'s 01/04/1968

Muro e Turismo
Correio da Manhã 02/08/1969

Dogma & dialética
Correio da Manhã 10/09/1969

Forma e fonte
Correio da Manhã 16/09/1969

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