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Antologia reabilita poesia de José Lino Grünewald

Por Nelson Ascher

A Nova Fronteira lança, no princípio de julho, ''Escreviver'', coletânea poética do crítico, tradutor e um dos fundadores do concretismo.

O Brasil não dispõe de bons poetas em número suficiente para se dar ao luxo de desperdiçar um que seja. No entanto, eis aí uma obra importante, um trabalho de mais de trinta anos, que só agora, com todo esse atraso, chega ao público. Trata-se da poesia de José Lino Grünewald, 56, mais conhecido como crítico e tradutor. Reabilitando-a do esquecimento, a Nova Fronteira lança sua coletânea poética "Escreviver" no começo de julho. O livro, prefaciado por Décio Pignatari, poeta e membro da equipe de articulistas da Folha, reúne setenta poemas escritos de meados dos anos 50 até 1985, divididos em duas seções: "Língua", com suas produções em verso; e "Linguagem", com seus poemas concretos e pós-concretos.
Nos anos 50, juntamente com Haroldo e Augusto de Campos e Décio Pignatari, José Líno foi um dos fundadores do movimento de poesia concreta. Amigo de Mário Faustino - "era meu amigo íntimo, vinha tomar banho no chuveiro de casa" -, ele o ajudou no suplemento dominical e na página "Poesia Experiência", do "Jornal do Brasil", que se tornou o principal porta-voz da vanguarda literária e artística de então.
Já naquela época, além da poesia, Grünewald militava na crítica cinematográfica. Em 1957, escreveu um artigo sobre Stanley Kubrick, preconizando que o futuro cineasta de "2001" se tornaria o maior diretor do século. José Lino foi também o primeiro crítico a descobrir o francês Jean-Luc Godard no Brasil: "No começo dos anos 60 escrevi o primeiro artigo a favor dele, um verdadeiro tratado, mostrando como seu filme 'Acossado' mudava radicalmente os métodos de montagem". Em 1968, pela Civilização Brasileira, José Líno publicou um livro pioneiro: "A Idéia do Cinema'', um manual básico sobre o assunto, para o qual ele havia selecionado e traduzido textos fundamentais de autores como Eisenstein, Resnais, Godard e Walter Benjamin (que provavelmente apareceu pela primeira vez no país nesse livro).

Música e jornalismo

José Lino é conhecido também por ser um melômano capaz de ir das mais complexas, óperas aos velhos cantores da MPB: "Gosto da MPB, pois ela é um modo de vida e eu conheço toda essa gente; pouco antes de morrer, o Mário Reis esteve em minha casa; mas odeio Milton Nascimento, Djavan e outros, pois, quando entra intelectual na música popular, ele estraga tudo; mesmo ao Caetano, que tem coisas importantes, eu digo, quando ele começa a cantar em inglês, para não me encher; gosto das coisas mais naturais dele, mas quando ele se mete a ser intelectual, vai para o espaço".
Uma das grandes paixões do poeta sempre foi o jornalismo, carreira que principiou, em 1956, no "Jornal do Brasil". Entre 1962 e 1970 foi editorialista político e editor de cadernos e páginas do "Correio da Manhã". Desde então, tem colaborado com artigos sobre literatura, política, música, cinema e TV em vários jornais do país.
Neste ano, saiu finalmente seu mais alentado trabalho: a tradução integral dos "Cantos” do poeta norte-americano Ezra Pound. Mas desde os anos 50 ele já trabalhava com tradução de poesia, cumprindo um dos ditames programáticos do grupo Noigandres - o grupo de poesia concreta - a que pertencia, ou seja, a necessidade de apresentar ao leitor brasileiro um novo elenco de autores estrangeiros. Suas traduções foram coligidas, em 1982, num número especial da revista baiana "Código" intitulado "Transas, Traições Traduções". José Lino verteu também para o português o dificílimo livro de prosa poética de Mallarmé, o "Igitur".

Seleção drástica

Mas sua poesia, a atividade que é o eixo de todas as outras, à parte aparições esporádicas em jornais e revistas, só contou com duas publicações de maior envergadura. A primeira, em edição do autor, foi seu livro "Um e Dois”, de 1958. A segunda foi numa antologia coletiva dele e de Augusto de Campos; Haroldo de Campos, Décio Pignatari e Ronaldo Azeredo, a "Antologia Noigandres 5", de 1962, que se tornaria um marco na história da poesia brasileira. Desde então, não houve qualquer reedição conjunta de seus poemas e mesmo esse "Escreviver" é apenas uma amostra de seu trabalho, não sua obra poética completa. Diz o autor que o livro "é uma seleção drástica, pois não quero selecionar mais nada e tenho preguiça de publicar". Referindo-se aos poemas da primeira parte do livro, ele diz "meus poemas em verso eram um exercício de fanopéia e melopéia que apontava para o nada", lançando mão da classificação poundiaria segundo a qual a fanopéia é a característica visual da poesia e a melopéia sua característica melódica, acrescentando que esses poemas "eram brincadeiras de artista influenciadas pelo Haroldo e pelo Augusto, coisas que eu fazia por puro esporte". Falando de seu poema "Lola", ele diz: "nunca conheci uma mulher chamada Lola, o poema é uma brincadeira com as letras L e S".
Já sua opinião sobre os poemas da segunda parte do volume é diferente: "alguns poemas concretos eu levo a sério e defendo com unhas e dentes; o poema 'Cinco', de 1958, por exemplo, que é o mais escandalizador e nem é propriamente um poema, pois tem mais a ver com a idéia grega de fazer, foi tese de mestrado de uma aluna do ex-ministro Eduardo Portela". Seus poemas favoritos estão todos nessa seção: "Cinco", "Vai Vem" (sobre o qual o filósofo alemão Max Bense, autor de 'Pequena Estética', escreveu um ensaio) e"Onã", do qual José Líno fala com prazer: "passado o tempo, não sou mais a pessoa que fez o poema e, como sou tão pobre que nem posso comprar um espelho, gosto de ficar me olhando e admirando nesse poema, que é das melhores coisas que fiz na vida”.

Gerações e porres

Perguntado sobre quais as obras poéticas mais relevantes de sua geração, o poeta se declara suspeito para responder, pois, segundo ele, "o que houve de importante fomos nós o Mário Faustino; o Haroldo, o Augusto, o Décio e o Ferreira Gullar". Apesar da antiga inimizade entre os poetas concretos e Gullar, José Lino o defende e diz que, influenciado pelo francês Antonio Artaud, seu "A Luta Corporal" é um dos melhores livros de poesia do século. Quanto às gerações posteriores, ele prefere nem falar: "prefiro ouvir ópera, não há mais nada para ler e, quando penso no Geraldo Carneiro, por exemplo, me dá vontade de saltar pela janela''.
Contudo, é bom que os amigos do poeta se cuidem, pois, à parte coletar seus artigos de cinema (que serão publicados pela Nova Fronteira), fazer, para a mesma editora, uma antologia de sonetos que vão desde o renascentista Sá de Miranda até Mário Faustino e começar a editar uma revista de arte, "Ventura", da editora Spalla, no Rio, José Líno está preparanqo um livro-bomba. Vai se chamar "Relato do Porre" e será uma mistura autobiográfica de ficção e documentário sobre sua geração, dos poetas concretos a Mário Faustino, Paulo Francis, Newton Rodrigues e todos os outros.

Folha de S.Paulo
24/06/1987

 
Poesia
Estado de Minas 10/09/1961

Eruditos & eruditos
Carlos Heitor Cony Correio da Manhã 28/09/1963

Prelúdio do Zé Lino
Carlos Heitor Cony Folha de S.Paulo 26/05/1965

A contracultura eletrônica
Jacob Klintowitz Tribuna da Imprensa 18/05/1971

Transas, traições, traduções
Carlos Ávila Estado de Minas 02/12/1982

Escreve poemas, traduz Pound, é crítico de arte e é de Copa
Vera Sastre O Globo 03/10/1983

O brilhante esboço do infinito jogo de dados
Nogueira Moutinho Folha de S.Paulo 09/12/1984

Diário das artes e da impensa
Paulo Francis Folha de S.Paulo 12/01/1985

Igitur, um Mallarmé para iniciados
Salete de Almeida Cara Jornal da Tarde 08/03/1985

Grünewald traduz Ezra Pound
Jornal do Brasil 12/03/1985

O grande desafio de traduzir Pound
Sérgio Augusto Folha de S.Paulo 16/03/1985

O presente absoluto das coisas
Décio Pignatari Folha de S.Paulo 06/09/1985

Ezra Pound - entrevista
Gilson Rebello Jornal da Tarde 26/10/1985

Pound, traduzido. Uma façanha ou loucura?
Isa Cambará O Estado de São Paulo 05/12/1986

J. Lino inaugura forma de pagamento
Ângela Pimenta Folha de S.Paulo 07/12/1986

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