DEUS é secundário. Muito bem dito por Marcelo Mastroiani, em sua entrevista para o Canal 6. Deus é dispensável: se todas as pessoas tivessem consciência disso, o mundo andaria bem melhor. A religião é a maior forma de institucionalizar a alienação que há na face da Terra. Como dizia Karl Marx, ela (a santa religião) traduz o ópio de povo. E "tantas voltas dá o mundo" (cite-se Custódio Mesquita), que, hoje, o marxismo é o ópio da Igreja Católica.
Temos de santificar os pagãos - com a devida urgência. A entrevista com o belo ator possui dois aspectos importantes. No primeiro deles, está lúcido o modo de editar: em vez da dublagem, genericamente aceita, Marcelo fala no seu italiano e acompanham-no as legendas. Com isso, a reportagem de Roberto D'Ávila ganha muito maior autenticidade. No segundo, são as próprias idéias do ator. Trata-se de uma personalidade altamente civilizada. E tem humor (este, aliás, o primeiro traço de civilização - quem não tem senso de humor que lave roupa ou outras coisas menos declináveis).
Mastroiani, da varanda, olha para Roma e, dela fala mal. Como nós, cariocas, do nosso inefável Rio de Janeiro. O Rio do Corcovado e da velha Lapa. Ele fala de Visconti e de Fellini. Compara-os muito certo. Em suma, fala de mulheres, de arte, de cidades e, especialmente, do primado da Vida. Um programa desses demonstra como é possível haver mais idéias na TV. Por que não entrevistar outros grandes atores, diretores etc.- sempre se esquivando da maldita dublagem. São seres civilizados - sempre terão, muito mais a dizer do que os "animadores".
O artista, em geral, como lateja Marcelo, tem um pacto com a inteligência; outros, até, com a vivência como pendura das expressões verbais. O Canal 6 lavrou um tento - esperamos outros.
Última Hora
04/10/1983