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Xerloque da Silva

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O absurdo

Acordou e leu o anúncio: "Vende-se apartamento na Avenida Atlântica, 300 metros quadrados, salão, galleria, três quartos, três banheiros completos, dependências completas de empregados, vista deslumbrante para o mar com vidros rayban. 60 milhões à vista." A seguir o telefone do corretor.
Deu um pulo da cadeira e discou. O corretor atendeu. Pergunta: "É verdade aquêle preço de 60 milhões para o apartamento na Avenida Atlântica? não faltou algum zero?" "É a pura verdade, exatamente 60 milhões, nem mais nem menos." "Negócio fechado para amanhã então." "Só tenho a alertá-lo", disse o corretor, "que está ocupado pelo inquilino, mas com contrato vencido e o sujeito é algo intratável". "Não faz mal, quero ocupá-lo para morar e se êle não sair de bom grado, ganho no fôro e sai à fôrça."
Saiu naquele dia, foi aos bancos retirar depósitos e aos corretores de títulos a fim de vender as suas letras de câmbio. Tudo isso era produto de anos de trabalho, economizado para uma ocasião como aquela. "Vou morar na Avenida Atlântica!", gritava eufórico, "deixar o maldito Méier". No dia seguinte, assinou a escritura no tabelião e recebeu as chaves. Resolveu jazer uma visita ao inquilino.
Entra saltitando no elevador e aperta o botão do 7º andar. Sai do elevador, olha qual porta tem o número 701 e aperta a campainha. Abre-se o reposteiro e uma voz enérgica grita lá de dentro: “O que é?" "Sou o nôvo proprietário e vim combinar com o locatário o dia de sua mudança." Em vez de escutar resposta, vê um cano de 45 sair pelo reposteiro e um berro: "Dê o fora senão come fogo." Começou a suar frio e seguiu de gatinhas, agachado, até o elevador. Tentou mais tarde falar pelo telefone, mas, pelo fio; seus tímpanos foram atacados por uma a saraivada de palavrões. Entrou então com uma ação de despejo. Notou então o sorriso de mofa do escrevente, ao receber a petição do seu advogado. Cinco dias depois, o oficial de Justiça veio com a resposta: "Ele recusa-se a receber a notificação e, mais ainda, jura que destruirá o apartamento caso saia de lá." Tentou a polícia e o detetive voltou, dizendo: “Se o senhor quiser vamos lá, mas ele promete uma batalha campal caso tenhamos de invadir o imóvel." “Não, não, assim não."
No dia seguinte, começou a anunciar o apartamento por 60 milhões. Não apareceu ninguém. Diminuiu para 50 - neca. Um ano depois, em desespero de causa, oferecia por 15 e nada. Nenhum corretor mais queria negociá-lo. Desespêro. Miséria. Seis meses depois, estava pedindo esmola na porta do seu imóvel, já completamente esfarrapado. Acabou sendo recolhido pela Fundação Leão XIII.

Correio da Manhã
15/03/1969

 
Fiscal fisgado
Correio da Manhã 14/01/1969

A mesma ilha
Correio da Manhã 15/01/1969

Bonnie sem Clyde
Correio da Manhã 16/01/1969

Imersão geral
Correio da Manhã 17/01/1969

Sinuca sangrenta
Correio da Manhã 18/01/1969

O homem-fome
Correio da Manhã 19/01/1969

Crime numa nota só
Correio da Manhã 22/01/1969

A receita do seu Zezé
Correio da Manhã 23/01/1969

A luta conjugal
Correio da Manhã 24/01/1969

O mistério do professor vermelho
Correio da Manhã 25/01/1969

Teatro Leve
Correio da Manhã 26/01/1969

O transplante
Correio da Manhã 28/01/1969

Idem idem
Correio da Manhã 29/01/1969

Cadê Zizi
Correio da Manhã 01/02/1969

Barulhinhos
Correio da Manhã 02/02/1969

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