O Livro de Carl R. Rogers (edição da Interlivros de Minas Gerais - 1971), Liberdade Para Aprender (Freedom to Learn), é daqueles que, apesar dos óbices de revisão e de tradução, encontrados nesta versão para o português, devem ser recomendados, principalmente a quem tenha contato com estudantes de vários níveis ou interesse nas reformulações dos sistemas de ensino, bem em dia, aliás.
Carl Ransom Rogers, além de Freedom to Learn, já publicou diversos livros: Measuring Personality Adjustment in Children (1931); Clinical Treatment of the Problem Child (1939); Counseling and Psychotherapy (1942); Client-Centered Therapy (1951); Psichotherapy and Personality Change (este, em colaboração com R. Dymond, em 1954): On Becoming a Person (1961); Man and The Sciences of Man. Além da psicoterapia, o grande interesse de CR sempre fot o estudo a respeito da formatividade da pessoa humana. Foi professor das Universidades de Ohio, Chicago e Wisconsin e, agora, da Universidade de Colúmbia. Já havia sido membro da American Psychological Association e do Western Behavioral Sciences Institute e, hoje, é membro permanente do Center for Studies of the Person.
REVOLUÇÃO
Somente depois da descoberta do seu ramo mais discutido - a psicanálise - é que foi possível, à psicologia, se tornar o grande fator de operação das revoluções na área do ensino. A atitude de alguns, ainda querendo negar, em bloco, a importância histórica da psicanálize (ou de qualquer método psicológico), às vezes, em contrapartida ao formalismo, até de cunho religioso, praticado por muitos oficiantes bem remunerados de análises, sessões ou lições, torna-se pueril se observarmos que a sua influência não se limitou a aspectos científicos ou literários, mas chegou à atuar sobre o uso dos idiomas, isto é, também imprimiu um condicionamento ao léxico, ao repertório de palavras e termos do dia-a-dia. A verdade é que, no momento em que Freud desferiu o último e fulminante golpe na moral clássica, na dicotomia bem versus mal (hoje, qualquer pessoa normalmente civilizada sabe que ninguém é mau porque quer - muito menos porque Satã haja desejado), o fenômeno do conhecimento haveria de ganhar subsídio estrutural para o seu exame. E a atividade psicanalítica já é fenomenológica em si - exatamente na época da fenomenologia, na era da relatividade, que liquidou com a apreensão mecânica, causal.
Evidentemente, isto haveria de, finalmente, refletir nos derradeiros redutos da mentalidade, sequer clássica, porém medieval: os estabelecimentos de ensino. Isto porque, até em decorrência do desenvolvimento da mesma psicologia, o século XX tenha sido o primeiro a conhecer o sentido, não só formal, mas ontológico da liberdade. O que Rogers e outros procuram demonstrar é que, se inexiste desenvolvimento sem aprendizado, inexiste aprendizado - efetivo, funcional - sem liberdade. O aprendizado onde o Eu se integra com o instrumento e, então, pode se situar no mundo, no campo do comportamento, através do ato de conhecer. Se, sem liberdade, não pode haver objetividade diante de coisas, pessoas ou acontecimentos, muito menos frente à necessidade de aprender. Aprender partícularidades para apreender globalidades.
PRÁTICA
Neste seu livro, dividido em cinco partes (relatório experiências - relacionamento interpessoal - idéias sobre ensino - visão filosófica - modelos e planos de educação autodirigida) o autor, na primeira delas, exemplifica com os experimentos de Barbara J. Shiel, Volney Faw e também de sua autoria pragmática em ação. A partir desse ponto e, de acordo com a chave de estruturação adotada para o livro, vai, pouco a pouco, chegando aos pressupostos teóricos de uma nova perspectiva do ensino. Trata-se, inclusive, do ensino condicionado não somente ao mundo verbal, ao ABC, mas às solicitações do universo eletrodinâmico.
A chamada motivação permanence na ordem do dia; assim como a noção atual de valor, muito bem abordada por CR. Mas a expressão máxima, ampla, deste livro, é que a liberdade consiste ponto de referência para qualquer lance que se pretenda construtivo. A necessidade de ser livre (física ou interiormente) para ensinar ou aprender (e também os professores aprendem com os alunos), leva à luta contra os sistemas fechados; são estes últimos que geram as sociedades deturpadas em seus ideais e metas.
Correio da Manhã
24/03/1972