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O Grau Zero de Barthes

Acaba de ser lançada a tradução para o português de Le degré zéro de l'ecriture (O Grau Zero da Escrita), de Roland Barthes. Trata-se de uma iniciativa de grande interesse, por que, embora seja o primeiro livro de Barthes, publicado em 1953, talvez ainda seja a sua maior obra, a mais criativa como ensaio e pensamento.
Roland Barthes, no prefácio feito à edição da obra da coleção Médiations (em que apareceu juntamente com Elementos de Semiologia, obra de 1963, também lançada, em tradução, pela Cultrix), disse que o Grau Zero se consistia numa "reflexão sobre a condição histórica da linguagem literária". E, com isso, introduziu o conceito de escrita, uma "função" situada entre língua e estilo, que "é a relação entre a criação e a sociedade, é a linguagem literária transformada por sua destinação social, é a forma apreendida na sua intenção humana e ligada, assim, às grandes crises da história". Talvez, em paralelo, em decorrência de sua mediação a respeito do impasse de escrever, a fazê-lo concluir o livro com a idéia de se tornar a literatura a utopia da linguagem, foi que, num livro logo posterior, Mythologies, entre coisas "sérias", abordou assuntos tão "antiliterários", como o sabão ou a luta de catch.
Aborda o sentido de escrita sob vários ângulos, ou seja, da política, do romance, da poesia, da burguesia, da revolução, da fala. Ao mesmo tempo, teoriza a respeito de diferenças entre língua e linguagem, poesia e prosa. Um dos pontos mais fascinantes, cintilantes como expressão de pensamento, nessa obra, é quando ele discorre sobre o escrever em conjuntura político-social, as misérias do pretenso engajamento. Então, o problema do estalinismo. Depois de chamar a atenção para o "conteúdo eternamente repressivo da palavra ordem", procura mostrar a escrita estalinista como uma tautologia, porque, havendo a separação entre o bem e o mal, todas as palavras têm valor. Diz RB:

O que é certo é que a ideologia estalinista impõe o terror de qualquer problemática, mesmo, e sobretudo, revolucionária: a escrita burguesa é julgada, afinal de contas, menos perigosa que o seu próprio processo. Assim. escritores cornunistas são os únicos a manter, impenurbavelmente, uma escrita burguesa que os próprios escritores burgueses condenaram há muito tempo, no momento exato em que a sentiram comprometida com as imposturas de sua própria ideologia, ou seja, no momento exato em que o marxismo se viu justificado.

A argumentação é precisa e inquietante: de um lado, vislumbra-se a intolerância do obscurantismo e de faccionismo, que geraram o mostrengo do realismo socialista; de outro, a crise da literatura (ou das artes tradicionais em geral), salpicadas da mauvaise conscience do escritor burguês. Mesmo porque não adianta fechar os olhos ou adotar a postura do avestruz, para dizer que a arte só é arte quando fabricada na torre de marfim.
Necessário, sim, meditar na forma. Assim como Maiakóvski, imolado pelo Proletkult, dizia que não há arte revolucionária sem forma revolucionária. Barthes encerra magistralmente o capítulo sobre a escrita e a fala, ao estatuir que: "É porque não há pensamento sem linguagem que a forma é a primeira e última instância da responsabilidade literária, e é porque a sociedade não se reconcilia que a linguagem, necessária e necessariamente dirigida, institui para o escritor uma condição dilacerada".
Talvez, desde O que é a Literatura? de Sartre, seja O Grau Zero a melhor coisa no tema.


Correio da Manhã
23/12/1971

 
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Jornal do Brasil 18/08/1957

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Correio da Manhã 18/08/1962

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