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O homem-revólver

A apresentação de Ubu Rei fez invocar, aqui, o nome tão esquecido de Alfred Jarry, um dos autores mais bouleversants do fim do século XIX. Um dos mestres da patafísica, quase invencível no humor anárquico.
Jarry, no entanto, mais ainda do que teatrólogo, foi notável poeta - e poeta não só da anarquia, porém lírico. Escritor do peso da palavra, inovador em assonâncias e aliterações, recursos constantes em seus versos. Mário Faustino, quando fazia a sua página, Poesia Experiência, teve ocasião, por volta de 1957, de fazer uma rápida e instigante tomada de sua obra.
Nasceu em 1873; morreu em 1907. Foram trinta e quarto anos porém intensos e agitados, tanto criativa, como vivencialmente. Já foi chamado o homem-revólver, não só por gostar de brincar com armas de fogo, mas pela conduta de choque adotada diante de vários acontecimentos, importantes ou triviais. Pode-se dizer que era uma espécie de precursor de Oswald de Andrade. E, assim como Lautréamont foi surrealista avant la lettre, Jarry foi dada antes do dadaísmo.
Dada no escândalo. Vários episódios denotam isso. Foi, por exemplo, de bicicleta ao enterro de Mallarmé. Outro fato que virou anedota: a vizinha bateu-lhe à porta a fim de reclamar dos tiros que dava a esmo, com a pistola em punho, no jardim, porque podia matar algum dos seus filhos. Respondeu ele: "não faz mal minha senhora, se os matar, farei outros." Um dia, num café, achou de mau gosto o cachimbo de um frequentador e, incontinente, sacou do revólver e atirou. Errou o tiro e a bala varou o espelho ao fundo. No meio do pânico e da confusão, voltou-se para uma jovem, sentada em mesa perto dele e disse: "agora que o espelho se partiu, vamos conversar". (Isso é puro Groucho Marx.)
O seu livro, Le Surmâle (O Supermacho), é considerado por Jacques Henry Levesque como a sua grande obra. Publicado em 1902, com o subtítulo de "romance moderno", narrava os eventos por antecipação, isso é, em 1920. Previa já o domínio da máquina nos anos de 1920. É um delírio erótico, pré-dadá, pré-surrealista. O herói do romance, André Mareuil, bate o recorde amoroso do hindu de Teófrasto repetindo o ato sexual 82 vezes seguidas; dirigindo a bicicleta, derrota um trem e um quinteto de campeões de ciclismo numa prova de dez mil milhas; enfim, faz com que se torne apaixonada por e le "a máquina de inspirar amor", que havia sido exatamente construída com vistas a enfrentar a sua resistência sexual. Isso já é antecipação do que se lê nas histórias em quadrinhos, em matéria de super (e, por extensão, de produtos da civilização americana), de vários prosadores, no Brasil, entre eles, além de Oswald, de novos mais radicais como Ronaldo Azeredo. O Supermacho vem entremeado com versos de rima-surpresa, invocações mitológicas, em suma, também o lirismo imanente de um notável poeta.
A sua poesia estava inscrita, por outro lado, na técnica de logopéia, e que fez a glória de Laforgue (exemplos, em versão rápida: "sua assinatura / segue o caminho / sobre a natura / do pergaminho" "Tatane", um dos seus poemas mais famosos, "canção para enrubescer os negros e glorificar o Pai Ubu"). Exemplos de assonâncias em La regularité de la chasse: "chasse claire ou s'endort mon amour chaste et cher" ("caça clara onde dorme meu amor casto e caro") - esse verso é um dos melhores alexandrinos dentro da concepção simbolista. E os vês de "voler vers le ciel vain les voix vagues des vierges"? Jarry, tiro contra o escuro, para o futuro.

Correio da Manhã
04/10/1969

 
G. S. Fraser "The modern writer and his world" - Criterion Books
Jornal do Brasil 18/08/1957

Sophokles – “Women of trachis”
Jornal do Brasil 03/11/1957

Piet Mondrian
Jornal do Brasil 01/12/1957

The Letters Of James Joyce
Jornal do Brasil 12/01/1958

O poema em foco – V / Ezra Pound: Lamento do Guarda da Fronteira
Correio da Manhã 05/10/1958

Erza Pound, crítico
Correio da Manhã 11/04/1959

Uma nova estrutura
Correio da Manhã 31/10/1959

"Revista do Livro", nº 16, Ano IV, dezembro de 1959
Tribuna da Imprensa 13/02/1960

E. E. Cwnmings em Português
Tribuna da Imprensa 04/06/1960

O último livro de Cabral: “Quaderna”
Tribuna da Imprensa 06/08/1960

Cinema e Literatura
Correio da Manhã 07/10/1961

Um poeta esquecido
Correio da Manhã 24/03/1962

A Grande Tradição Metafísica
Correio da Manhã 05/05/1962

Reta, direto e concreto
Correio da Manhã 06/06/1962

A Questão Participante
Correio da Manhã 18/08/1962

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