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Razões da invenção poética

O signo e a Sibila, de Ivan Junqueira. Editora Top Books, 442 pgs. 

Poesia-tradução-ensaio: sobre esse tripé, Ivan Junqueira já deixou um trabalho significativo. Talvez, de tudo que já fez, o mais importante seja a tradução de “As flores do mal”, de Baudelaire – numa edição também rica em notas e comentários. Devo ressaltar que ainda não conheço a versão dos “Poemas reunidos”, do fabuloso Dylan Thomas.
Mas é com o mesmo Dylan Thomas que Ivan abre a seqüência de artigos e ensaios desse seu novo livro, “O signo e a sibila” (bruxa ou profetisa?). Num longo texto, dispõe com propriedade: “A poesia de Thomas está muito longe de ser caótica: há nela uma indestrutível ordem interna que só poderia ser confundida com a desordem na medida em que o poeta, coagido pelos limites lógicos da língua, rompe com os esquemas do organismo sintático e constelação semântica, mas sem jamais subverter o sistema da língua. E não se pode, como já se tentou fazer, confundir essa atitude com nenhum credo irracionalista”. E se poderia aduzir, pela outra vertente, que, mesmo na série de poemas em formato geométrico, nada existe de racionalismo formalista. Do losango de “Who are you who is born” até sua compreensão em formato oposto de ampulheta (finalizando com o verso magistral – “One. The sin roars at the prayer’s end”) estamos apenas diante do reforço visual de super-estrutura para o processo sístole/diástole.
Dylan Thomas, na década de 1950, era uma revelação para nossa então jovem geração de presumidos poetas. Mário Faustino, Augusto de Campos, Décio Escobar, Júlio César Leite, eu e outros mais carregávamos no bolso a tradução de seu belíssimo e mais famoso poema (também dos mais fáceis). “In my craft or sullen art” (“Em meu ofício ou arte severa”). Impressionava o seu modo de recitar – voz e verbo; a sua gravação de “And death shall have no dominion (“E a morte não terá soberania”) chegava praticamente ao estágio de canto. No que se entende por poesia “puta” – ou seja, predominância de imagem e som e maior distanciamento do arco de conceitos – Dylan talvez não encontra rival neste século – pelo menos em língua inglesa. Nem Hart Crane, nem Cummings, nem Pound, nem Eliot, nem Auden, nem Wallace Stevens (e vamos pôr um dos pés de Yeats no século XIX) podem amarrar suas sandálias, reviver aquela sua imponente dicção elizabetana.
Nesse livro, além dos ingleses e algo dos alemães, há muito sobre literatura em língua portuguesa – brasileira principalmente. Escritos sobre poetas como Drummond, Bandeira, Vinicius, Gullar, Moacyr Feliz. E, como fecho de outro, novamente Dylan Thomas; uma rápida análise a respeito de seu valor como contista. Mas há também um outro tópico – abordado de frente ou de raspão – que vale a pena comentar: Décio Pignatati e a poesia concreta. Ao contrário do que pensa Ivan Junqueira, considero Décio o maior poeta brasileiro vivo do período posterior ao de João Cabral. Tanto no verso, como na poesia concreta. Na primeira hipótese, onde são citados poemas que o próprio Ivan Junqueira elogio. Décio inovou em matéria de imagem e de fraseado. Criticava-se muito seu hermetismo, mas o hermetis é, muitas vezes, o núcleo da invenção. O santo e benvindo hermetismo: Mallarmé, John Donne, o surrealismo, uma das águas de Cabral, Haroldo de Campos, de novo Dylan Thomas e por aí afora. São as usinas que, depois, acendem as luzes nas casas, como falava Maiakóvcki. E, por isso, o livro histórico de Ferreira Gullar ficou sendo “A luta corporal”.
Quanto à poesia concreta, ela nada tinha de “arrogante”. Nem seria arrogância lembrar que, desde há mais de 30 anos, os poetas concretos do grupo “noigandres” (Augusto e Haroldo de Campos, Décio, Ronaldo Azeredo e este que vos fala) têm seus poemas concretos traduzidos e publicados no exterior em pelo menos mais de dez línguas ocidentais e, também, orientais. O que se pretendia simplesmente era criar matrizes de processo de formulação lingüística, projetar uma função. E, nisso, Pignatari foi o ponta-de-lança. Além disso, Ivan Junqueira foi enganado por um erro auditivo de Antonio Houaiss. No ensaio em que ele se baseia para criticar o concretismo, Houaiss atribui a Décio a frase: “A poesia concreta foi feita para desfechar um enxame de sentimentos cerebrais”, quando na verdade Décio era contra esse enxame.
Não cabe aqui, de novo, teorizar sobre o assunto. Só cabe registrar que a quantidade pequena, e cada vez mais decrescente, de poemas se deve tão somente à dificuldade, cada vez mais crescente, de descobrir e/ou formular novas estruturas. No entanto, um poeta original, como Carlito Azevedo, fez um belo poema concreto, com “Traduzir”. E isso porque ele soube pensar nas coisas. É isso aí.

O Globo
14/11/1993

 
G. S. Fraser "The modern writer and his world" - Criterion Books
Jornal do Brasil 18/08/1957

Sophokles – “Women of trachis”
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Piet Mondrian
Jornal do Brasil 01/12/1957

The Letters Of James Joyce
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O poema em foco – V / Ezra Pound: Lamento do Guarda da Fronteira
Correio da Manhã 05/10/1958

Erza Pound, crítico
Correio da Manhã 11/04/1959

Uma nova estrutura
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"Revista do Livro", nº 16, Ano IV, dezembro de 1959
Tribuna da Imprensa 13/02/1960

E. E. Cwnmings em Português
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