A era da inocência
Autor: Edith Wharton
Ideia: O romance, que o cineasta Americano Martin Scorsese transformou em recente filme, descreve as frustações existenciais da alta sociedade nova-yorkina do século XIX.
Logo na primeira frase desse romance, há uma récita do Fausto, de Gounod, na Academia de Música de Nova York, protagonizada pela grande soprano sueca Christine Nilsson (1843-1921) e pelo tenor francês Victor Capoul (1839-1924 ). Ambos, depois, brilhariam no Metropolitan (então, ainda não inaugurado), onde ela cantaria a mesma ópera na inauguração daquele teatro. Mas, como Capoul somente cantou em 1871 na academia, eis aí o ano certo para situar o entrecho de A Era da Inocência - informação que não nos é fornecida no decorrer da história. Logo nesse primeiro capítulo, pelo cenário, pelos olhares e bate-papos de foyer, dá-se o enquadramento do livro: aristocrático, sofisticado, ou seja, "culto" – no sentido envernizado desse conceito.
Estamos diante de um antológico romance de costumes, focalizando a high society de Nova York nos últimos trinta anos do século passado. A Nova York que começa a crescer como uma das grandes capitais internacionais, onde a alta-roda imita os modelos europeus, mas ainda permanece bastante provinciana no sentido de encarar os fatos e o comportamento das pessoas. Enfim, a doença do moralismo assolando a maioria.
Edith Wharton, por esse A Era da Inocência, publicado em 1920, ganhou o prêmio Pulitzer de 1921. Seu livro mais conhecido é Ethan Frome (1911), passado no meio rural. Além disso, pode-se lembrar o conjunto de quatro novelas, sob o título de Old New York, o romance The Buccaneers ou a autobiografia A Backward Glance (Um Olhar para Trás). Para muitos existe uma evidente influência de Henry James na obra dela, o que é corroborado por R. W. B. Lewis na introdução do volume agora lançado.
No entanto, o que chama a atenção é não ter sido à toa que Edith também, em 1925, deu à luz um manual, The Writing of Fiction (Escrever Ficção). Isso demonstra predeterminação estética, dentro de um conceito de estilo que conduz a uma calculada cascata de requintes. Afinal, também, o estilo é a mulher... Por isso mesmo, o esmero e as minúcias na descrição de personagens e ambientes, a farta utilização de termos franceses - pendor da alta burguesia nas sociedades afluentes. E proliferam os detalhes cult - "saber que lhe seriam servidos patos selvagens e vinhos de boa safra, em lugar de Veuve Clicquot morno (a de menos de um ano) e croquetes da Filadélfia requentados" (p. 32). Era o tempo em que a alta sociedade nova-yorkina dançava o Danúbio Azul. Edith Wharton não procura maiores introspecções em suas personagens, mas, com um realismo refinado e rococó, sem concessões, é um fabuloso Balzac de saias
Revista IstoÉ
29/09/1993