Valem algumas considerações a respeito das transmissões de futebol pela televisão. Há, de saída, a comparação com o rádio. Este último excita o ouvinte; a TV estimula a análise, a crítica imediata, embora, nas transmissões diretas dos jogos, não deixe também de desfechar emoções. Mas vejamos uma comparação simples: quando o locutor de rádio, no meio daquela agitação de ruídos e com a voz rápida, grita "chuta!!!", o torcedor põe o coração pela boca. Vai ver na televisão, o chute foi mascado, a bola saiu pererecada e o goleiro posou para os fotógrafos.
Na realidade, o rádio possui uma montagem sonora que a TV dispensa, por causa da evidência da imagem, seu realismo implacável. No rádio, o ouvinte é conduzido a uma excitação, não só devido aos chutes, mas pela imaginação do narrador, seus gritos, suas chamadas a quem está atrás do gol, a interrupção também gritada dos anúncios. Enfim, ganidos a sobrevir de todos os lados.
O audiovisual da TV tem um compromisso fatalmente maior com a realidade. Em primeiro lugar, dispensa a interrupção da narrativa com os anúncios, porque estes podem ser superpostos à imagem. Os comentários e entrevistas também podem desenvolver-se enquanto o jogo segue. O locutor, com voz mais pausada, limita-se a identificar os atletas e reiterar os lances e as marcações do juiz. Ou seja, sob a nudez da verdade via imagem, a frieza do relato meramente acessório, que ajuda a esclarecer. E ainda reforçado pela repetição imediata das principais jogadas, com a variação de tomadas: por exemplo, de frente, de lado ou detrás do gol. De qualquer modo, nesta nossa era da reprodutibilidade em massa, os arquivos das filmagens já começam a dar uma inestimável contribuição para se aferir a evolução e a transformação dos esportes.
Resta apenas, no tocante à lucidez da lei da oferta e da procura, que clubes, federações e até a própria CBF não continuem com a postura do avestruz diante do maior veículo do século e saibam com ele bem conviver, financeira e culturalmente. Para o bem de todos, sem o primado absurdo de proibir transmissões sem sequer negociar.
Última Hora
17/09/1983