jlg
televisão

  rj  
Teoria da TV

O preconceito contra a televisão em vários círculos da chamada inteligência leva em conta mais a qualidade de boa parte dos programas do que o veículo em si. Existe, inclusive, a imagem do aparelho avançando de dedo em riste para o pobre espectador prostrado, encolhido e mesmerizado numa cadeira. Acontece que esse mesmo espectador não dá nem dará bola para os protestos e as charges. Continuará vendouvindo, a manipular o seu espetáculo particular, familiar.
É muito comum também ouvir-se dizer que a televisão prejudica a cultura, conferindo-se, aí, ao termo uma espécie de restrição semântica, ou seja, a cultura como última etapa dos assim denominados refinamentos da sensibilidade. Mas, desde pelo menos
The Fall of the House of Usher (A Queda da Casa de Usher), de Edgar Allan Poe, já se poderia calcular que esse tipo de concepção caminhava para o declínio. Cultura tem a ver com a ação do homem em todos os sentidos e seu marco inicial pode ser configurado na descoberta do instrumento. E é a partir daí que se torna possível realizar o paralelismo entre o mundo cultural e o mundo natural. Este é o livro da realidade primeira; mas proporcionou ao homem os elementos para escrever o livro da realidade "segunda", que pode, no entanto, vir a explicar a própria natureza.
Mas, vamos deixar a metafísica e retornar a algo aparentemente menos complexo que é a televisão. A TV é uma das infinitas consequências daquela descoberta do instrumento em priscas eras e, hoje, representa a maior forma de cultura, o mais poderoso veículo, pois através dele é que a informação, de maneira mais global, atinge concomitantemente o maior número de pessoas.
Vale, aqui, tentar estabelecer uma distinção nossa entre informação e comunicação. A informação constitui o dado novo, um fato, um sinal, uma obra de arte. E vem emoldurada num maior ou menor grau de redundância, quer dizer, a conotação do passado, da coisa conhecida. Isso traduz o elo com aquilo que se chama prosaicamente de "realidade". Se não houvesse tal elo, as informações atacando em estágio de novidade pura, ocorreria o entendido como choque cultural. Um exemplo frisante disso é o desfecho do filme 2001: Uma Odisséia no Espaço, de Stanley Kubrick. Ou então, se os nossos sonhos se materializassem e a montagem dos seus eventos viesse a se consistir no tempo cronológico a que estamos habituados, enfim, acabar com a lógica sublinhada no relógio.
A comunicação, por seu turno, traduz a informação entrosada com o seu veículo. Os veículos são incontáveis, vão da grande simplicidade à maior complexidade. Conferem o tomus definitivo àquilo que se informa, alteram os efeitos e, em muitos casos, até a própria estrutura do dado novo. Uma coisa, por exemplo, é sabermos que fulano vai ser o presidente da República mediante um sussurro pessedista ao pé do ouvido. Outra, é sabermos através de um alto-falante. Diferente ainda tomar conhecimento do fato diante de um aparelho de TV.
O estudo e teorização dos veículos implica, portanto, estudo da comunicação. E o grande veículo de massas, da atualidade, é, sem dúvida, a televisão. E, aqui, sua primeira peculiaridade: no caso, geralmente, a massa de pessoas não está confinada espacialmente, como num estádio ou num cinema. São indivíduos isolados ou grupos de pessoas muito pequenos, cada qual diante de seu vídeo, a assistir a programas e transmissões que, muitas vezes, estão atingindo dezenas de milhões de pessoas. Uma espécie de espetáculo intimista proporcionado a um público imenso. E aí, então, mais uma observação a fazer. Em decorrência dessas condições habituais em que a TV atua, como veículo, a natureza da catarse é diversa, em relação, por exemplo, ao cinema ou ao rádio. Uma coisa é sentir a emoção proporcionada por determinado filme, junto com 500 pessoas, outra, na solidão de um quarto ou de uma sala. Uma coisa é escutar o Fla-Flu através do alto-falante, no meio de uma pequena multidão, outra, com emoções inteiramente diversas, assistir ao jogo sozinho, na frente do vídeo. A informação é a mesma - o Fla-Flu, seu impacto será diferente para cada hipótese. A sua contextura também mudou: o Fla-Flu que estou ouvindo com a multidão não é o mesmo que estou vendo na TV.
Resta ainda mostrar que, ao contrário do cinema, o espectador participa bem mais na TV. Ele pode manipular o aparelho e alterar uma contextura. No cinema, estamos imobilizados. Na TV, aumentamos ou diminuímos o som, aumentamos ou diminuímos a intensidade da cor (ou, até mesmo, simplificamos a exibição para o preto e branco), graduamos os contrastes, a luminosidade, etc. Essa participação pode ser mecânica, às vezes, inconsciente como acionamento cultural.
A televisão não é, portanto, apenas um aparelho de captar informações. Ela é uma forma de conhecimento. Ela difere do cinema, assim como o texto impresso difere do texto lido para nós. Neste último caso, nós somente ouvimos num modo estático de captação, enquanto que, no primeiro, nós podemos manipular o approach do mesmo texto; ou seja, relemos, saltamos um trecho, conferimos nosso ritmo à leitura. É por isso também que a Imprensa escrita tem importância. E, a assim, o mundo do alfabeto ainda tem seu lugar na face da Terra. Só não possui ascendência cultural.

O Estado de São Paulo
26/11/1978

 
Verviver a Fórmula 1
Última Hora 30/11/-1

Existem duas grandes formas de cultura...
O Estado de São Paulo 10/07/1970

O tempo de Gide
Correio da Manhã 11/11/1971

TV Solene
O Estado de São Paulo 10/05/1972

Teoria da TV
O Estado de São Paulo 26/11/1978

Luz, câmara - teleação...
Jornal da Tarde 17/07/1980

Talves uma das loucuras do século...
O Estado de São Paulo 02/08/1980

Para Lenin, o cinema era a "arte do século"...
O Estado de São Paulo 23/08/1980

A Odisséia chega ao vídeo
Última Hora 15/09/1983

A Televida
Última Hora 16/09/1983

Transmissões de futebol
Última Hora 17/09/1983

Tecnologia do Fantástico
Última Hora 19/09/1983

Documentário e ficção
Última Hora 20/09/1983

“Eu Prometo”
Última Hora 21/09/1983

A Questão da Censura
Última Hora 22/09/1983

54 registros
 
|< <<   1  2  3   >> >|