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Xerloque da Silva

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O recalcado

Após algum tumulto e ligeiro burburinho, fêz-se silêncio na assembléia de reunião do condomínio do Edifício Baby-Doll. A Mesa ia iniciar a contagem dos votos na eleição do nôvo síndico: de um lado, Floriano (na vida pública, oficial administrativo, nível 16); de outro com a sua barbicha cínica, o dr. Quejada (sem vida pública, vivendo de pequenas rendas, literato amador). A contagem teve marcha emocionante e, ao fim, numa diferença de 4 votos, Floriano foi aclamado. Suou frio de felicidades com o espocar do ápice de sua vida – aquela vidinha recalcada de funcionário antigo, que jamais fôra nomeado chefe de seção. Agora, era síndico - síndico!! Algumas pessoas vieram logo cumprimentá-lo e, ali mesmo, principiou o sussurrar das fofocas (aquelas fofocas que eram a sua vida, de condômino de 12 anos e aspirante nato ao pôsto máximo no prédio). "Que alívio! que alívio!" - disse-lhe a dona Brizolina, moradora do térreo - "êsse Quejada, além de chato, é incompetente e imoral". "(sim, é sim" - corroborou o dr. Licurgo, dentista que habitava no 2º andar - "outro dia, só para épater, o safado veio-me com a seguinte frase: "O maior crime da história da humanidade foi a destruição de Sodoma e Gomorra." "Vai ver que ele é que é sodomita" - palpitou o filho do seu Félix, do 10º andar. "Vou acabar com a imoralidade neste prédio!" - exclamou, onipotente, o nôvo síndico.
Ébrio de autoridade, Floriano, logo no primeiro dia de gestão, começou a baixar os seus atos institucionais: 1 - uniforme limpo e passado a ser usado por todos os porteiros; 2 - proibir a porteiros e demais empregados de conversar e namorar as domésticas; 3 – expulsão imediata de cachorros, gatos, outros mamíferos bípedes e até o sabiá cantante de dona Zezé, do 8º andar; 4 - proibir visitas, a qualquer título, aos moradores, depois das 10 horas; 5 - proibir crianças de frequentar o pátio interno; 6 - proibir ajuntamentos na porta do prédio; 7 - nomear comissão de 3 moradores, para, no prazo improrrogável de uma semana, examinar as contas irregulares da administração anterior e sugerir os procedimentos civis e penais contra os infratores; 8 - mudar o nome do edifício de Baby-Doll para Vestal em Flor.
Susto. Pânico. Protestos. Floriano, inflexível. Sua mulher aprendeu a erguer o pescoço flácido. Dois dias depois, invadiu o apartamento de um morador que recebera a visita inocente de uma prima. Mando desligar a fôrça de outro que tocava alto o rádio. Não ouvia reclamações. Até que, certa manhã, ao ver uma crioula de biquini, limpando os vidros de um apartamento, subiu correndo, arrombou a porta e, com o susto, ela caiu com estrépito sobre o tôldo salvador. Escândalo. "Currador!" berraram os moradores. "Safado!". Chegou a RP, foi prêso e demitido. Não teve coragem de voltar ao prédio. Atirou-se, de panamá, dentro do Mangue.

Correio da Manhã
19/04/1969

 
Fiscal fisgado
Correio da Manhã 14/01/1969

A mesma ilha
Correio da Manhã 15/01/1969

Bonnie sem Clyde
Correio da Manhã 16/01/1969

Imersão geral
Correio da Manhã 17/01/1969

Sinuca sangrenta
Correio da Manhã 18/01/1969

O homem-fome
Correio da Manhã 19/01/1969

Crime numa nota só
Correio da Manhã 22/01/1969

A receita do seu Zezé
Correio da Manhã 23/01/1969

A luta conjugal
Correio da Manhã 24/01/1969

O mistério do professor vermelho
Correio da Manhã 25/01/1969

Teatro Leve
Correio da Manhã 26/01/1969

O transplante
Correio da Manhã 28/01/1969

Idem idem
Correio da Manhã 29/01/1969

Cadê Zizi
Correio da Manhã 01/02/1969

Barulhinhos
Correio da Manhã 02/02/1969

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