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"Trágico amanhecer"

Realizado em 1939, à partir de um script original de Jacques Viot, "Trágico Amanhecer" (Le Jour se Lève) se inscreve entre os maiores filmes de Marcel Carne .
Assistido novamente, hoje, apresenta-se vivo, atuante, evidenciando poucos sinais de desgaste pelo tempo. Deve-se isso, principalmente, ao rigor de sua elaboração artesanal, um trabalho de perfeccionista que, quando deseja, poucos sabem ser como Carné. Um exemplo do empenho do diretor, segundo o relato do crítico Jean Queval, é a cena em que Jean Gabin, simplesmente, sai da janela, apanha o ursinho e volta para o mesmo lugar, o que foi obrigado a repetir durante cinco horas.
Esse rigor artesanal não está apenas caracterizado palmo a palmo, com cada sequência. Ele cumpre severamente as coordenadas de um planejamento estrutural, um sentido de organicidade enfeixando os diversos efeitos de uma vigorosa linguagem visual, oferecendo ao mesmo tempo, uma contida participação das opções de Prèvert, o grande colaborador de metteur-en-scène.
O desenvolvimento da fita compreende duas ações – uma no presente outra no passado - entrecruzadas à base de três flash-backs, sendo o último o trecho inicial da primeira cena do presente. A evolução dramática é rálpida e direta, cumprindo um fluxo ascendente simples, despido de maiores interpolações. No caso da ação na atualidade, o crive é o da tensão, que tem seu desenlace com o suicídio do protagonista no instante em que a polícia atira no quarto uma bomba de gás lacrimogênio.
Não deixa de ser válida a constatação de uma certa primazia de algumas soluções de "Trágico Amanhecer" com relacão a muitos filmes norte-americanos posteriores no gênero. Pelo menos, até a epoca da realização de Carné, não havia nenhum que obtivesse idêntica qualidade de impacto.
"Le Jour se Lève" não está tão adstrito à filosofia pessimista de "Cais das Sombras". Se, neste, o ponto de partida já é a marginalidade, a ausência de um ponto de apoio para seus personagens, em "Trágico Amanhecer" os protagonistas saem do equilíbrio, da estabilidade social para, com a intervencão do acaso, serem vítimas de um destino adverso. Consubstancia-se, assim, em tragédia pura, num estrito desdobramento fatalista que não comporta maiores indagações, a não ser aquelas de caráter objetivo, prêsas à conjuntura dramática.
Existe, sem dúvida, uma grau de discrepância entre a parte do presente e a dos flash-backs, tendo muito maior vigor a primeira. O que elide uma desigualdade maior é o aspecto funcional dessa diferença. Os trechos desenrolados no passado, além de mais prévertianos, detendo maior proeminência dos diálogos, apresentam-se arrefecidos em sua fôrça puramente visual. Aqui está a comparação feita através de medidas e recursos diretamente artesanais. A atualidade equivale à tensão, ao clímax dos eventos; o passado é algo que apenas interessa na medida em que explica e modula a crise. Daí, sómente aquêle leve fluir descritivo, entrecortado pelos retornos ao quarto do protagonista ou às tomadas da pequena multidão, aguardando na rua o desfecho dos acontecimentos. Todavia, essa opção que, se não chega a representar um desleixo, impõe uma linear neutralidade para o sentido do ritmo nos três retornos, coloca alguns senões na quase perfeita unidade compacta da fita.
De qualquer maneira, "Le Jour se Lève" marca um ponto forte para Carné, especialmente em paralelo com os outros grandes diretores de sua época, na luta entre os filmes e a erosão do tempo.
Duas colaborações valiosas ao êxito da realização: os cenários de Trauner, criando uma ambiência adequada à tonalidade dramática e permitindo a fixação de um clima denso; a fotografia de Agostini, Curt Courant e André Bac, de admirável riqueza plástica, principalmente nas cenas decorridas no presente.
Entre os intérpretes, há Jean Gabin em um dos seus grandes papéis, rendendo bastante. Jules Berry, muito mais contido do que de hábito, vai bem num tipo que lhe assenta. Arletty, ótima atriz, não tem muita chance de brilhar num personagem de atuação mais passiva dentro da trama; suas grandes oportunidades, excelentemente aproveitadas, chegariam, também pelas mãos de Carné, logo depois, em "Les Visiteurs du Soir" (Os Visitantes da Noite) e "Les Enfants du Paradis" (O Boulevard do Crime): Dominique é a inesquecível Garance.

Tribuna da Imprensa
09/10/1959

 
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