Premiada com o “Nastro D’Argento”, “Adorável Inimiga” (L’Incantevole Nemica) é uma película agradável de ponta a ponta e que também nos chama a atenção para um diretor, Cláudio Gora, do qual não nos recordávamos de já ter assistido a alguma realização.
Este surge com pretensões bem menores do que André Michel, não denota, pelo menos ao primeiro contato, o temperamento do esteta. Porém, valendo-se de um argu mento fértil em situações divertidas, consegue manter o filme sempre nas estrias de um compasso vivaz e revela um salutar desembaraço no entremear de sequências através dos cortes.
É fácil reparar a utilização constante do grande primeiro plano, cujos motivos preponderantes apresentam provavelmente o escopo de jogar a base das reações dos personagens ante um fato inesperado ou estranho. Destarte, o diretor procura extrair o máximo das expressões dos protagonistas: o caricato Carlo Campanini, em mais um papel semelhante aos que tem feito ultimamente e com sucesso; Robert Lamoureux, que não é um mau tipo, embora seja pouco maleável em suas contrações fisionômicas; e a bela Pampanini, controlada em alguns de seus tiques.
"L'Incantevole Nemica" se configura numa saborosa sátira à mentalidade burguêsa com seus temores do comunismo. O enrêdo se prende aos receios de um curioso e extravagante proprietário de uma fábrica de que alguns operários ligados ao P. C. estejam em vias de engendrar um atentado contra a sua vida – tudo isso proveniente de um malentendido provocado pelo zêlo excessivo de seu yes-man. Julgando que o tímido e recatado Mancini seja o cabeça do complô, procura convertê-lo mediante um contínuo processo de adulação, convidando-o a que frequente diariamente a sua mansão, indo o exagêro ao ponto do pobre operário se casar com a bela filha. Dai em diante, avolumam-se os quiproquós finalizando tudo com um happy-eding algo banal, mas que não chega a empanar os aspectos positivos do celulóide.
São determinados detalhes cômicos curiosos ou inusitados em sua concepção, como o prego que atravessa a parede dicisora dos dois quartos dos operários, cuja função é de cabide, exigindo entretando que ambos coloquem os paletos ao mesmo tempo. Também a primeira visita de Mancini à residência do patrão oferece facetas interessantes no tratamento da irreverência e do non-seuse, bem como a festa do casamento que termina com o carro do industrial sendo escoltado por um caminhão que leva uma charanga dos trabalhadores agitando a bandeira da União Soviética.
Até certo ponto, “Adorável Inimiga" reforça a boa impressão que algumas comédias italianas de caráter leve e despretensioso vem construiudo: "Era Ele”, "Paris é Sempre Paris”, “Patos e Papoulas”, etc. E não há dúvida de que o próprio Walter Chiari mais ainda a reforçaria se ocupasse o lugar de Robert Lamoureux, num papel que lhe cairia como uma luva.
Jornal do Brasil
29/12/1957