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Sublime tentação

Por iniciativa do Museu de Arte Moderna, que vem ultimamente imprimindo um considerável impulso ao desenvolvimento dos estudos cinematográficos aqui no Rio de Janeiro, foi exibida, em "avant-première”, no novo e excelente auditório de "O Globo", a realização de William Wyler, "SubIime Tentação" (FriendIy Persuation), que acaba de receber o grande prêmio no Festival de Cannes.
Wyler, já veterano, o grande mestre que manipula com os mais diversos gêneros - do drama à comédia, da fita de ação à adaptação teatral - reaparece com uma película de altas qualidades, malgrado seja-se lícito, por ora, colocar em dúvida a justiça do laurel que coube a "Friendly Persuation", principalmente levando-se em conta que seus adversários eram Bergman e Fellini, atualmente merecedores de maiores esperanças em suas realizações do que ele e, por outro lado, sabido que é fato de a notícia do resultado oficial ter sido recebida com várias manifestações de desagrado.
De qualquer forma, "Sublime Tentação" se constitui num espetáculo de ponta a ponta bem dosado, abordando um tema de difícil tratamento, ainda mais se tomarmos em consideração que o celulóide tem cêrca de duas horas e pouco de duração e não há momento em que o ritmo - funcionalmente lento - caia na monotonia, graças à evidente capacidade do "regisseur", aliada a um cenário muito bem urdido. Este último é de autoria de Michael Wilson, cujo nome não figura nos letreiros por se tratar de persona non grata ao Comitê de Atividades AntiAmericanas, fazendo parte, portanto, da já famosa lista negra – ameaça séria aos cineastas independentes, aos que não são delatores, aos antifacistas, aos que são contra a guerra, e também um estímulo à completa cocacolificação dos que pensam por si. Foi assim, para ficarmos apenas nos derradeiros casos, que Kazan levou um “carão", que Dassin e John Berry levaram uma "corrida" e que Dmitrik tomou-se às preocupações com as peripécias em Hong-Kong do octogenário Clark Gable.
Partindo de um argumento sôbre a tranquila e pacata vida dos quakers, perturbada peIa guerra de Secessão, o cenário, elaborado com precisão, pleno de soluções eficientes, permitiu que Wyler construísse sequências de elevado nível, algumas saborosas como a da visita à feira na cidade ou as de disputa de corrida entre o chefe da família quaker e seu vizinho. A única cena de batalha existente na fita merece, outrossim, referências, especialmente o instante em que o jovem é demoradamente focalizado em primeiro plano, nervoso, a armar a sua espingarda enquanto a refrega prossegue com intensidade em volta de si.
O ponto alto do filme é, no entanto, a fotografia de Ellsworth Fredricks: excelente noção de perspectiva, utilização apurada do enquadramento, obtendo efeitos plásticos de beleza absoluta principalmente quando se atém a uma visualização pictórica de caráter estático em que consegue, mercê a atenuação das linhas de contôrno com a consequente elisão da proeminência do elemento volume, criar imagens de extrema leveza, semelhantes em muito, nesse ponto, com as estampas odentais.
No elenco, predomina Dorothy McGuire, com atuação mais uma vez destacada. Deve-se frisar, porém, que todos os intérpretes correspondem às solicitações de seus respectivos papéis, sem haver a menor dissonância, desde o velho Gary Cooper, passando pelo ganso Samantha, até o
menino Richard Eyer.
Dimitri Tiomkin é o responsável pelo acompanhamento musical e Pat Boone se encarrega das canções.
"Friendly Persuation" vem confirmar a boa forma em que se encontra ainda Wyler, um artesão dos mais perfeitos que existem, sem a menor dúvida. Embora êle não seja um inventor, isto é, não leve a linguagem cinematográfica para a frente, como o fazem um Bergman, um Kubrick, um Aldrich, um Hitchcock, um Elia Kazan, malgrado já não possua à fôrça de um Fellini ou a de um Stevens ou mesmo o dinamismo de Nicholas Ray, continua, por ora, a proporcionar realizações de classe, algumas de alto nível, já que sabe manejar com eficiência os novos instrumentos que se lhe oferecem e trilhar com segurança o caminho desbravado por outros. Basta que examinemos a sua filmografia para a constatação do grande número de excelentes realizações nela contidas, desde alguns dos maiores sucessos de Bette Davis, passando por "Os Melhores Anos de Nossa Vida", pelo admirável "Tarde
Demais" (The Heiress) até o extraordinário "Chaga de Fogo" (Detective Story), talvez a melhor película que tenha levado a efeito. Nessa sua derradeira fase, na qual pode-se colocar ainda "Detective Story", embora as outras fitas pairem num plano sensivelmente abaixo, se constituem entretanto em espetáculos de categoria: "Carrie", "Horas de Desespêro'', "Sublime Tentação'', este últim o um pouco superior.

Jornal do Brasil
11/08/1957

 
Uma Odisséia de Kubrick
Revista Leitura 30/11/-1

As férias de M. Hulot
Jornal do Brasil 17/02/1957

Irgmar Bergman II
Jornal do Brasil 24/02/1957

Ingmar Bergman
Jornal do Brasil 03/03/1957

O tempo e o espaço do cinema
Jornal do Brasil 03/03/1957

Ingmar Bergman - IV
Jornal do Brasil 17/03/1957

Robson-Hitchcock
Jornal do Brasil 24/03/1957

Ingmar Bergman - V
Jornal do Brasil 24/03/1957

Ingmar Bergman - VI (conclusão)
Jornal do Brasil 31/03/1957

Cinema japonês - Os sete samurais
Jornal do Brasil 07/04/1957

Julien Duvivier
Jornal do Brasil 21/04/1957

Rua da esperança
Jornal do Brasil 05/05/1957

A trajetória de Aldrich
Jornal do Brasil 12/05/1957

Um ianque na Escócia / Rasputin / Trapézio / Alessandro Blasetti
Jornal do Brasil 16/06/1957

Ingmar Berman na comédia
Jornal do Brasil 30/06/1957

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