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Fim do racionalismo

Dois eventos-parábolas: paralelos: a) Caramuru chega aqui, atira e espanta os índios; b) o final de 2001 de Kulbrick & Clarke, quando o astronauta pára além das galáxias, vê coisas do passado, vê-se a si próprio noutras idades e, na fecundação com o monolito, transforma-se no cósmico. O materialismo simples explicaria os dois casos, dizendo que, no primeiro, os índios, cientificamente mais atrasados, desconheciam a pólvora e cederam ao misticismo, e que, no segundo, o desconhecimento nosso a respeito da realidade, fora da Terra, permite todas as fantasias da ficção.


Elementar, mas incompleto. O que está em jogo é a ontologia do que se chama fenômeno, não tanto o natural, mas o pára-normal. E, aí, o apêlo místico não é assim uma posição alienante, como se pode julgar apressadamente; trata-se de um ímpeto natural de se tentar atingir a raiz do fato, pelo menos tangê-lo - é uma forma de conhecimento, como o são a arte, a psicanálise etc, etc. E tão concreta que sempre existiu no ser humano, animal simbólico, e só se extirpa com o seccionamento do cérebro.

Se o mito pode ser definido como a concretização de uma verdade coletiva, o misticismo seria a concretização de dúvidas essenciais, individuais ou coletivas, até mesmo a incerteza sôbre essas dúvidas. São fenômenos impossíveis de entendimento através do raciocínio e causalidade lógica. Nem pela religião; esta institucionaliza a atividade mística, que é dinâmica, dialética, não-lógica, tornando-se o ato de crer um ritual formalista, a impedir a verdade da procura. Aqui, porém, é outra questão filosófica, da religião, véu sôbre a verdade, como necessidade coletiva.

Foi o próprio e extraordinário denvolvimento da ciência, no século atual, que liquidou com o racionalismo clássico, na função de núcleo central das formas válidas de conhecimento. Aí estão coisas como a topologia e a parapsicologia, tôda .a arte em suma, a fim de mostrar que, se a inteligência sempre percebe relações (e tudo tem a ver com tudo), elas nem sempre podem ser regidas ou detectadas pela causalidade lógica ou historicamente linear. O fim do cartesianismo e do enlightment, mal substituídos pelo materialismo dialético (o "ópio do povo" continua em ação, dopando inclusive as contestações éticas e políticas), foi a impotência de instauração de instrumento único e adequado para o homem alargar a sua atividade de procura, além e dentro de si mesmo. Pois, parece que alguns deuses "que foram astronautas" não descobriram a pólvora. Pois parece que 2001 evidencia que a crise do materialismo, ou de sua razão de ser, é a própria noção de falta de medida da matéria, a assolar o homem.

Correio da Manhã
14/08/1970

 
Wiener ou Cibernética
Correio da Manhã 12/04/1964

OP X POP uma opção duvidosa
Correio da Manhã 02/10/1965

Mitos políticos
Correio da Manhã 31/10/1965

Cristãos & Ocidentais
Correio da Manhã 22/12/1965

Moral & Salvação
Correio da Manhã 13/01/1966

Semântica & Nacionalismo
Correio da Manhã 25/02/1966

Ruínas de Conímbriga
Correio da Manhã 19/10/1966

Coimbra: canção e tradição
Correio da Manhã 09/11/1966

Beatnicks: protesto solitário
Correio da Manhã 10/05/1967

Os filhos que devem nascer
Guanabara em Revista nrº7 01/07/1967

Despir os Tabus
Correio da Manhã 12/01/1968

Ninguém ri por último nas fábulas do povo
Revista do Diner\'s 01/04/1968

Muro e Turismo
Correio da Manhã 02/08/1969

Dogma & dialética
Correio da Manhã 10/09/1969

Forma e fonte
Correio da Manhã 16/09/1969

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