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O amor é o mobile

O sucesso de Love Story, best-seller que, inclusive, também já virou filme de bilheteria, passa até a preocupar sociólogos. Por que, na época neopagã de liberação erótica e de um lugar ao sol à pornografia, o retorno de algo tão simples, de um espírito desusado – uma história de amor? Seria moda? É pouco. Pode, sim, até parecer que, até hoje, perdido nas contradições do cristianismo, o homem busca conhecer ao âmago aquilo que lhe é mais inerente, não só em comunicação, mas em autoprojeção: o nome dado é amor. Isto talvez explique a ciclagem temática, no campo da arte, a oscilar entre os extremos da pureza ou da pornografia, da sublimação e do erotismo.
A definição de amor, ao mesmo tempo em extensão e em intensidade, não encontra o seu norte vivencial, a sua ontologia, na adoção de qualquer das tendências opostas. Nem a atitude platônica, muito menos o sexo, conduzem a isso. Ou seja: nem o distanciamento do rito mental, nem o corpo-a-corpo biológico. “Amor é constância”, diz um personagem de Giuseppe Patrone-Griffi – verbalização de uma pista, onde, através do estar afetivo e/ou possessivo, se possa tatear a essência.
Pelo menos o assim chamado “amor à arte” é capaz de induzir ao
animus, mediante a representação simbólica. Talvez a dialética do amor, com a tomada de seus pólos, opostos, não haja encontrado melhor desenvolvimento do que com a obra dos poetas metafísicos, assim denominados por Samuel Johnson, e altamente valorizados neste século por outros poetas e críticos da estatura de um Pound ou um Eliot, por exemplo. Os metafísicos renovaram a área semântica do poema, ao introduzirem termos referentes à ciência e tecnologia da época: cartografia, matemática, arquitetura, etc. Mas o tema, em grande parte, era o mesmo que glorificou Provença; mais intelectualizado. E representaram o amor com as duas fazer, da eternidade e da perenidade. John Donne, enquanto fêz a sua elegia, Going To Bed (Indo para o Leito), de teor erótico, dizendo que o seu corpo era a “melhor coberta” para o da amada, criou também The Extasie, um dos maiores poemas de amor platônico. E, na mesma alta-voltagem de dicção e requinte alegórico, Andrew Marvell tem a resposta com o inigualável To His Coy Mistress (À Amada Esquiva), quando alerta a ela sobre a passagem do tempo, dizendo que os vermes hão de comer a sua virgindade. O próprio Marvell, no entanto, em seu Definition of Love, imerge no veio idealista, ao consumar a definição através de imagens geométricas de linhas oblíquas e parelelas. Shakespeare, por seu turno, foi ainda mais metafísico do que os metafísicos, em A Fênix e a Pomba, imaterializando o tema com um jogo de conceitos matemáticos contrários: “então amaram como o amor/ em cada par tem uma essência/ dois diversos sem divergência/ e morto o número do amor”.
Todo um transe estético ao longo da história evidencia, isso sim, a procura- ou seja: de que a dúvida é sempre concreta, enquanto a certeza, abstrata. O poeta, enfim, descobre que o homem, mesmo inconscientemente, está, assim, sublinhando deveras o meio e, não, o fim. Por isso, voltamos a lembrar a expressão comum: amor à arte. O verso de um dos sonetos ingleses, de Fernando Pessoa, viria a dar a procurada definição, ao estipular uma atitude dogmática: “amo, mais que a ti, ao meu amor por ti”. E, também por isso, o verdadeiro criador ama o seu fazer (procura) e não se tenta justificar através de fatores indicados pelo seu mundo referencial, que estejam fora da própria essência da obra.

Correio da Manhã
30/05/1971

 
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Dogma & dialética
Correio da Manhã 10/09/1969

Forma e fonte
Correio da Manhã 16/09/1969

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