J. Lino inaugura forma de pagamento
Além do ineditismo da tradução completa em português de “Os Cantos”, de Ezra Pound, José Lino Grünewald inaugura também um novo tipo de vinculo com as editoras no país. O pagamento, mensal e adiantado, é bastante razoável para o mercado editorial brasileiro. Segundo a Folha apurou, durante quase dois anos, o tradutor recebeu um quantia próxima de dez salários mínimos, algo em torno de Cz$ 8.004,00. Prevista para o início do ano, a tradução só ficou pronta agora. A editora Nova Fronteira não pressionou o tradutor. A seguir, uma entrevista com José Lino Grünewald.
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Folha – Quanto tempo demorou a tradução?
José Lino Grünewald – Levei um ano e oito meses para traduzir “Os Cantos”. A produção de um livro como este é muito trabalhosa. Como não foi possível terminá-lo em março a editora achou de bom alvitre adiar o lançamento para o natal.
Folha – Por que traduzir Ezra Pound?
José Lino – O Pound é o maior poeta do século. Se bem que os “Cantos” tem partes muito prosaicas, onde você se pergunta” – por que traduzir essas besteiras? A verdade é que ele fez uma montagem eisensteiniana de poesia e prosa em que se revela como o maior anticapitalista da época. Os vilões dos “Cantos” são os banqueiros e corretores de seguros. Ele condena o lucro, a usura. Por isso é um absurdo dizer que Ezra Pound era fascista. Mentira. Ele teve um desvio ideológico ao cair no colo de Mussolini, mas era totalmente contra a “dinheirocracia”.
Folha – Como foi feito o pagamento da tradução?
José Lino – Os irmãos Lacerda são meus amigos, são indivíduos da maior seriedade. Não se preocupam em editar só o vendável. Fui tratado com o maior respeito profissional, recebendo meu salário com correção monetária e tudo mais.
Folha – A condição de assalariado não prejudica a produção poética?
José Lino – Não se o poeta a ser traduzido é Ezra Pound. Se fosse o Josué Montello, eu me jogava pela janela.
Folha – Parte dos “Cantos” já tinha sido traduzida por Décio Pignatari, Haroldo e Augusto de Campos. Isto influenciou sua tradução?
José Lino – Foi dificílimo. Décio, Haroldo e Augusto são meus amigos íntimos. Tive que encontrar soluções diferentes. É claro que se Pound dizia “good morning”, eu tinha que por bom dia. Resolvi com a tradicional ginga carioca
Folha de S.Paulo
07/12/1986