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O idílio devastado

Por Mauro Trindade

Os poetas do Arcadismo mineiro, protagonistas da Inconfidência, foram reunidos em livro

Duzentos anos após ser deflagrado, o movimento político conhecido por Inconfidência Mineira continua esquartejado pela memória nacional. Entre as vítimas mais esquecidas estão as poesias de Tomás Antônio Gonzaga, Cláudio Manuel da Costa e Alvarenga Peixoto, que o poeta e tradutor José Lino Grünewald selecionou e organizou na antologia Os poetas da Inconfidência (Editora Nova Fronteira, 220 páginas, Ncz$ 182), já nas livrarias. Há ainda um outro registro da Inconfidência Mineira atualmente no Rio: está em cartaz na Fundição Progresso o espetáculo Tamem, que investiga a figura de Tiradentes.
“Prefiri o termo Inconfidência porque é mais jornalístico, apesar de considerar mais correto conjuração”, justifica José Lino a denominação do movimento conspiratório mineiro que buscava a independência da Capitania na segunda metade do século 17. Sua origem concreta está na onda de descontentamento da população com os altos impostos exigidos pela coroa portuguesa, que se transformou num vagalhão com a derrama, cobrança de grande soma de impostos atrasados. Formado por padres, militares, fazendeiros e escritores, o movimento tinha suas raízes ideológicas no enciclopedismo francês e na independência norte-americana. A delação de Silvério dos Reis e de outros conjurados, em maio de 1789, condenou os principais líderes à prisão, ao exílio ou à morte: “O 21 de abril, data em que se comemora a Inconfidência, está errado, pois é o mês de maio de 89 que marca o episódio em seu mais amplo sentido histórico”.
José Lino explica que o mais importante neste livro é “repor os poetas que ainda estava fora de circulação.” A última edição com poemas árcades brasileiros foi lançada a cerca de dez anos e hoje estes escritores não passam de ilustres desconhecidos nomes vagamente citados no curso segundário. Para ele, “o Ministério da Cultura deveria reeditar algumas obras da maior importância para literatura brasileira”, que possam redimensionar o papel político e cultural de nossos poetas coloniais.
Com o lastro dourado de suas minas, Vila Rica – atual Ouro Preto – produzia arte em arroubas, numa mistura de estilos e tendências grosseiramente chamada de barroco mineiro que, no entanto, carregava em seu bojo uma criação musical bem mais próxima do clássico de Moazart que de Bach, e uma poesia de inspiração arcadista. Pertence aos três escolhidos dessa antologia a melhor poesia brasileira da época, e alguns dos poemas selecionados conseguem ser de extraordinária atualidade. “Eles não era poetas engajados”, previne José Lino. A única exceção são as Cartas Chilenas, versos satíricos que ironizavam o então Governador da Capitania Cunha Menezes e seus colaboradores. “Por muito tempo discutiu-se a quem pertenciam, mas hoje sabemos que foram escritas por Tomás Antônio Gonzaga. Pensei em publicá-las todas, mas o livro ficaria desequilibrado”, lamenta.
E é exatamente Tomás Antônio Gonzaga quem merece o maior destaque no livro, pelo volume de sua obra. Português de nascimento, acabou se envolvendo definitivamente com o Brasil, quando veio para ocupar o cargo de ouvidor de Vila Rica. Torna-se amigo de Cláudio Manuel da Costa e Alvarenga Peixoto, com que articula planos de inssurreição. Com a repressão da Inconfidência, Antônio Gonzaga foi condenado ao exílio em Moçambique, onde ainda gozou de grande destaque social e político. Nunca mais voltou ao Brasil.
Cláudio Manuel da Costa teve fim trágico, supostamente assassinado na prisão por sicários do Visconde de Barbacena, que também participou da Conjuração e temia ser delatado. Além de seus sonetos, escreveu dramas musicados, o longo poema épico Vila Rica e é possível que tenha colaborado com seu amigo Antônio Gonzaga em Cartas Chilenas.
“Talvez a melhor poesia, pertença a Alvarenga Peixoto”, observa José Lino Grünewald. Certamente teve a vida mais animada. Juiz em Vila Rica e viveu um escandaloso romance com a poetisa Bárbara Heliodora, a quem chegou a saudar como futura rainha de Minar Gerais. Foi ele quem escolheu o verso libertas quae sera tamen, das Bucólicas, de Virgílio, para ser a legenda da bandeira autonomista. Segundo alguns autores, tanto o casal, quanto Manuel da Costa, teriam enlouquecido com a perseguição.
Enquanto lutavam por uma libertade que só chegou cerca de 30 anos depois, os poetas do Arcadismo mineiro criaram um idílio bucólico habitado por musas e educados pastores, que abrandavam seus dias sob as copas das árvores, libando alguma paixão. A corou tratou de corrigi-los. O paraíso foi perdido e o idílio, devastado.

Jornal do Brasil
19/12/1989

 
Poesia
Estado de Minas 10/09/1961

Eruditos & eruditos
Carlos Heitor Cony Correio da Manhã 28/09/1963

Prelúdio do Zé Lino
Carlos Heitor Cony Folha de S.Paulo 26/05/1965

A contracultura eletrônica
Jacob Klintowitz Tribuna da Imprensa 18/05/1971

Transas, traições, traduções
Carlos Ávila Estado de Minas 02/12/1982

Escreve poemas, traduz Pound, é crítico de arte e é de Copa
Vera Sastre O Globo 03/10/1983

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Diário das artes e da impensa
Paulo Francis Folha de S.Paulo 12/01/1985

Igitur, um Mallarmé para iniciados
Salete de Almeida Cara Jornal da Tarde 08/03/1985

Grünewald traduz Ezra Pound
Jornal do Brasil 12/03/1985

O grande desafio de traduzir Pound
Sérgio Augusto Folha de S.Paulo 16/03/1985

O presente absoluto das coisas
Décio Pignatari Folha de S.Paulo 06/09/1985

Ezra Pound - entrevista
Gilson Rebello Jornal da Tarde 26/10/1985

Pound, traduzido. Uma façanha ou loucura?
Isa Cambará O Estado de São Paulo 05/12/1986

J. Lino inaugura forma de pagamento
Ângela Pimenta Folha de S.Paulo 07/12/1986

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